Contextualização nos games
Já se perguntaram na falta de contextualização dos jogos? E como isso padroniza os jogos e afeta a experiência de jogo?
(Uncharted e Tomb Raider)
Isso é uma coisa que me incomoda muito. Diria que talvez é a coisa que mais me faz não gostar do jogo. Precisa um jogo medieval ter goblins/dragões do universo tolkieniano? um open world ter um sistema de missões/quests? Tiroteio e waves de inimigos? Survive e zumbis? Jogos de terror e o jogador ser um inútil ou um fracote? Sistema de loot? Craft? E assim a lista vai aumentando...
Podemos dizer que existe uma certa padronização nos jogos, e que isso acaba passando sem ninguém se quer se pergunte o por que daquilo.
Algumas coisas se tornaram tão padrões nos jogos que os devs (tantos indie quanto AAAs), acabam se esquecendo de contextualizar, e se prendem a “padrões” pré-estabelecidos anteriormente para propostas diferentes, que não valoriza necessariamente o game design do jogo dentro do universo criado. E isso limita na própria criatividade.
Pra exemplificar, não existe jogo melhor do que os novos Tomb Raiders.
(Tomb Raider Reboot - 2013)
No Reboot, Lara é uma jovem arqueóloga que esta seguindo os passos do pai. No meio do caminho, sua expedição acaba naufragando e ela se vê perdida e sozinha numa ilha misteriosa e perigosa.
Poucos minutos depois do inicio, nos deparamos com uma cena muito importante no jogo, onde faz essa construção da personagem, que tem que sobreviver. Ela se sente obrigada a matar um cervo, para se alimentar e come-lo, e os devs deixaram explicito que ela não sabia como se virar, como matar.
Pouco tempo depois, ela pega armas e começa a fuzilar um exercito particular inteiro.
Perceberam o quão errado é isso tudo?
Não pensaram na contextualização, apenas aplicaram uma padronização: Inimigos para se ter desafio, já que a parte de escalada e plataforma foi banalizada, precisando se sustentar completamente no tiroteio. Precisa ter momentos "WoW", craft, loot e a lista vai aumentando, e f**a-se o resto. E nada faz sentido.
Mas alguns podem dizer “Ah, mas é o padrão da industria, tem que ter ação, tem que ter isso, tem que ter aquilo”
Digo que estão completamente errados. Existe sim a possibilidade de criar todos esses pontos comentados, sem a necessidade de apelar para o comum.
Ou também ir para outro caminho. Poderia fazer uma construção que a Lara realmente se tornou assassina psicopata, ou com uma forte pegada de sobrevivência e ter que entender e reconhecer o ambiente em sua volta, ou até mesmo uma modernização do conceito antigo, de explorar tumbas com um forte apelo de ação e aventura com elementos de plataforma.
Não é um problema exclusivo dos novos Tomb Raiders, mas gosto de usar esse exemplo pois é muito mais evidente. O próprio Uncharted que esses TRs novos se inspiraram, sofre do mesmo mal, e muitos outros jogos...
(Horizon Zero Dawn, no vídeo da apresentação do PS4 Pro, a protagonista sai atirando em animais roboticos sem quaisquer razões, pra coletar itens para fazer craft)
Meu ponto é:
Que tal pensarmos na experiência que isso vai trazer e não se acanhar a formulas que deram certo em propostas completamente diferentes?
Os recente jogos open world são outros grandes exemplos de padronização sem pensar em como isso afeta negativamente todo o fluxo do jogo. Grande parte dos AAAs seguem a ideia do GTA, de fazer missões para outros NPCs. Essa mecânica funciona para a contextualização DO GTA, mas ao aplicar em outros jogos completamente diferentes, acaba fadado ao marasmo do mundo ser apenas um hub de um ponto para o outro, se esquecendo que o mundo DEVE ser a fase, e acabam falhando miseravelmente. Outro ponto é a necessidade de ter side quests, tirada dos RPGs de mundo livre, que acaba se tornando uma coisa completamente desnecessária por estar fora de contexto. A ideia de subir em pontos altos para sincronizar o mapa também é algo completamente ridículo caso não tenha um gameplay vertical ou um bom motivo para se fazer isso, e se torna mais uma mecânica falha e fora de contexto.
É necessário ter tudo isso para ser um bom open world com um bom replay value?
(Assassin's Creed Unity, falhando em sua proposta)
Uma comparação dentro de uma franquia recente com pouco tempo separando os jogos. Assassin's Creed Unity sofre de todo o mal que se tem em jogos open worlds, apenas reaplicando conceitos que não se aplicam para o universo do jogo, numa revolução francesa onde temos que assassinar nomes importante da história. Se faz tudo no jogo, menos o ponto principal.
No entanto, Assassin's Creed 1, apesar de muitas pessoas reclamarem, é um excelente exemplo em algo completamente contextualizado e construído em cima disso. Toda a mecânica da serie foi construída aqui, pensando no contexto histórico da época do jogo, onde realmente existiu uma seita de assassinos, nomes importante das cruzadas que foram mortos misteriosamente e uma conspiração acontecendo de fundo, e o jogo todo se sustenta em cima disso, e é fantástico! Você realmente se sente nesse mundo como um assassino, não como um zueiro que escala prédios durante a revolução industrial ou francesa.
(Assassin's Creed, criado e contextualizado perfeitamente)
Retornando a minha questão, que tal pensar além do padrão?
Precisa mesmo ter inimigos? É a unica maneira de se criar desafios? Meu personagem poderia matar alguém? Quais as consequências disso? E assim vai…
Alias, poderia se desprender também da ideia de que precisa desafiar o jogador, isso é um vestígio da época de arcades que se espalha até hoje. Existem outros conceitos que podem nos deixar intrigados além da competição e desafio. Trabalhar com conhecimento, emoções, relações, etc...
Não estou dizendo para explicar tudo e o inexplicável (Imagina ter que explicar por que o mundo do Mario é de cogumelos? Lol), mas a simples abordagem de uma maneira diferente para algo que até então é comum, é o suficiente para ser mais.
E felizmente, temos jogos que fazem isso.
(A abertura do Shadow of the Colossus apresenta tudo que você precisa saber)
Shadow of the Colossus é um dos jogos mais fantásticos e um dos open world mais interessante que existe, não precisou ter inimigos entre os colossi para ter mais desafio, e nem por isso se tornou um boss rush. Não precisou ter quests e pontos de interesse a cada 5 metros para te fazer ter vontade de explorar o mundo. Não precisou ganhar skills, loots e fazer upgrades para o jogo se manter interessante por horas a fio. Simplesmente se contextualiza na sua proposta principal, e executa perfeitamente. Um rapaz fazendo o impossível para salvar sua amada, sendo isso mais importante do que o que é certo e errado. PONTO.
Outro bom exemplo é Undertale, que pega um conceito tão simples, e muda sua contextualização. Você não precisa matar todo mundo, na verdade, você pode vence-los de outras maneiras, sendo cada batalha unica, e você pode entender o lado deles e se tornar amigo deles! Você não é recompensado com um loot de um equip +5, mas sim ganhando a amizade de um personagem, e isso é muito mais gratificante do que qualquer outra coisa que já ganhei em um jogo, pois a gente luta para mante-los vivos e para ter sua amizade, e isso agrega que realmente se experiencia a ideia de amizade. Mas ao mesmo tempo você pode ignorar isso tudo e jogar da sua maneira, mas no fim, sua experiência foi agradável?
Existe muito território não explorado nos games, e eles podem trazer experiencias únicas que qualquer outra mídia jamais vai conseguir.
(Sans - Undertale, You're gonna have a bad time)
O que vocês acham disso tudo? Comentem!