De certa forma eu concordo que o Gaspar Noé é um tanto pretensioso. Mas ele é uma boa porta de entrada para quem entender o cinema por ele mesmo. Quem está acostumado a modos de narrativa convencionais pode ao assistir o filme Irreversível ter uma outra concepção sobre o cinema. E pessoalmente esse filme me provocou dessa maneira na primeira vez que eu o assisti uns anos atrás. Algumas pessoas vão sentir isso com David Lynch, outras com algum outro cineasta. O meu ponto é que só servi do exemplo do Gaspar Noé porque ele é mais claro, sem ser completamente non sense como o Lynch é. Irreversível é um filme fácil de ser compreendido. Talvez os primeiros 30 minutos do filme não façam tanto sentido e pareçam um monte de cenas sem conexões lógicas umas com as outras, mas o expectador em um momento ou outro saca qual é a do filme e então passa a compreendê-lo. Com um Lynch você tem que ver os filmes várias e várias vezes para fazerem sentido. Pra mim entre os filmes surrealistas dele só um faz sentido na primeira assistida que é o Blue Velvet. E se eu cito Blue Velvet, o meu exemplo perde a sua força. Se citar The Elephant Man então, pior ainda, porque é um filme quase que completamente convencional. Então que filme serve de referência para alguém que quer entender o cinema de forma não convencional? Irreversível pra mim é isso. Mas claro, como coloquei, para outras pessoas pode ser outro filme.
Eu não quis dizer que nada no videogame chega perto do que o cinema faz. O que eu quis dizer é que essas duas mídias objetivam fins diferentes. Para certos objetivos o cinema sempre irá fazer melhor, para outros, o videogame irá fazer melhor. Se a finalidade, por exemplo, for realizar uma história dramática, o cinema tem mais chances de atingir esse objetivo. Mas se, por outro lado, a finalidade é provocar uma tensão e logo em seguida uma sensação de gratificação, o cinema não chegará nem um pouco perto de fazê-lo, porque é uma mídia passiva, não tem como um expectador se sentir realizado ao final de um filme como ele se sente ao final de um game em que ele sente que conquistou habilidades, superou um desafio. Algumas filmes, como é o caso dos filmes do David Lynch, até tentam algo próximo disso. Mas sem um teste, uma prova final, quem assiste o filme não pode ter a convicção de tê-lo debulhado como alguém que joga um jogo. Sobre isso aliás tem um livro pequeno chamado Elogio da Beleza Atlética de um autor chamado Gumbrecht em que ele discorre sobre o esporte e as emoções únicas proporcionadas por essa dimensão da vida.
E eu particularmente não tenho nada contra quem discorde de mim. Se eu tivesse problemas com isso não estaria aqui em um fórum, pois ele serve para isso.