WASHINGTON -
Kamala Harris assume nesta quarta-feira, 20, a vice-presidência dos EUA como a primeira mulher e primeira negra a chegar à Casa Branca. O componente histórico de sua ascensão não é o suficiente para descrever o que a democrata passou a representar. Desde que entrou na chapa de
Joe Biden, Kamala é vista também como o rosto do futuro da política nos
EUA.
Era a imagem de Kamala que aparecia quando Biden afirmava que a eleição de 2020 ia “determinar como os EUA vão se parecer por muito, muito tempo”, uma das mais emblemáticas peças de campanha. No vídeo, um discurso de Biden sobre ódio e extremismo é unido à música
Where is the love. A cena de Kamala ligada à fala sobre o futuro do país foi uma das mais celebradas durante a festa nas ruas de Wilmington quando os dois venceram a eleição.
Biden está distante da ala jovem do
Partido Democrata. Mas a inclusão de uma filha de imigrantes de 56 anos e primeira mulher não branca a chegar à Casa Branca foi bem recebida pelo eleitorado, que pede por quadros políticos mais representativos da sociedade americana.
A ex-senadora californiana tornou-se imediatamente cotada para concorrer à Casa Branca em 2024, já que Biden anunciou que deve ser um presidente de “transição” para o futuro do partido.
Celebrada entre apoiadores, ela tem o rosto estampado em camisetas nas cidades progressistas, como Washington. A frase “senhor vice-presidente, eu estou falando” – dita por ela quando o vice
Mike Pence a interrompeu durante debate – virou ímã de geladeira vendido em lojas feministas.
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“Eu posso ser a primeira mulher nesse cargo, mas não serei a última”, disse Kamala no discurso de vitória, em 7 de novembro em Wilmington.
A ex-procuradora-geral da Califórnia é filha de pai jamaicano e mãe indiana que se conheceram nos EUA marchando pelos movimentos civis.
Kamala e Biden foram apresentados por Beau,
filho de Biden que morreu em 2015. Os dois eram amigos quando ele era procurador-geral de Delaware e ela tinha o mesmo cargo na Califórnia. Kamala prometeu ser leal a Biden e honrar todas as lutas que travaram para que, em 2021, a primeira mulher pudesse chegar à Casa Branca.
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Beatriz Bulla, correspondente, O Estado de S.Paulo
20 de janeiro de 2021 | 04h00
WASHINGTON - Valorização do multilateralismo, boa relação com aliados e preocupação ambiental. Os pilares da política externa proposta por
Joe Biden mostram que os Estados Unidos, a partir desta quarta-feira, 20, devem voltar a desempenhar no contexto internacional o papel que tinham antes da chegada de
Donald Trump à
Casa Branca. Com a nova política externa, Biden promete buscar o que julga ser a “restauração da liderança moral” dos Estados Unidos e a “liderança pelo exemplo”, após quatro anos de isolamento e confronto com nações amigas.
Biden é conhecido por gostar e entender do assunto. Sua experiência com política externa no Senado impulsionou seu nome como vice-presidente de
Barack Obama, em 2008. Durante os oito anos na Casa Branca, ele assumiu missões internacionais em nome do presidente, como o relacionamento com países da América Latina.
Nesta quarta-feira, 20, logo após tomar posse, o democrata promete assinar uma ordem para recolocar os EUA no
Acordo Climático de Paris – um dos tratados menosprezados por Trump e negociado na gestão Obama-Biden. Trump descartou organizações multilaterais, relações de longa data dos EUA e tinha afeição por autocratas – o que se traduziu em proximidade com regimes da
Coreia do Norte e da
Arábia Saudita. Biden acredita na construção de soluções conjuntas e quer recolocar o país na mesa das negociações coletivas ao lado de aliados.
“Joe Biden é um internacionalista. Ele acredita em colaborar com outros países. Vamos deixar para trás a política de ‘América Primeiro’. Ele terá questões com a China, mas, de uma maneira geral, recolocará o país em uma dinâmica de cooperação multilateral”, afirma Michael Traugott, cientista político e professor da Universidade de Michigan.
Ao apresentar os primeiros nomes do governo para política externa, Biden disse que a equipe vai “reunir o mundo” para enfrentar desafios que “nenhuma nação pode enfrentar sozinha”. “É tempo de restaurar a liderança americana”, costuma dizer o democrata.
A política nacionalista denominada “
América Primeiro” norteou as relações externas de Trump, que com seu estilo autoritário e isolacionista entrou em choque com aliados históricos como França, Alemanha e Canadá. A eleição de Biden foi saudada pelos líderes dos três países.
Mas a tensão comercial com a
China, uma das principais marcas da gestão Trump, deve continuar. Biden criticou o que considera práticas comerciais abusivas da potência asiática e a falta de proteção a direitos humanos de minorias no país. A visão negativa sobre a relação com a China é crescente entre os americanos – tanto entre democratas como republicanos.
A estratégia, no entanto, tende a mudar. O democrata já criticou a guerra de tarifas iniciada no governo Trump, que considera “errática”. O time de Biden defende que a pressão sobre os chineses seja feita por meio de uma união com aliados e uso de mecanismos legais na
Organização Mundial do Comércio (OMC) – órgão que sofreu boicote durante o governo Trump.
Na lista de acordos que Trump deixou para trás e Biden planeja restabelecer está o tratado para limitar o programa nuclear iraniano em troca do alívio de sanções.
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Uma das críticas ao democrata tem a ver com seu apoio a parte das intervenções militares em outros países. Em 2001, Biden apoiou a invasão no
Afeganistão. Depois, como vice, trabalhou para a redução das tropas no país. Em 2003, ele também apoiou a invasão no Iraque, mas durante a campanha disse ter cometido um erro.
Clima
Biden colocou as mudanças climáticas entre as quatro prioridades de seu governo durante a transição de mandato e nomeou o ex-secretário de Estado e um dos principais nomes da diplomacia americana,
John Kerry, como um czar do tema no Conselho de Segurança Nacional. É a primeira vez que um nome dedicado ao ambiente terá assento no Conselho de Segurança, o que significa que discussões climáticas devem permear toda a política externa. O democrata já prometeu “reunir o mundo” para obter fundos para preservação da Amazônia e disse que haveria consequências econômicas caso o Brasil não se comprometesse em proteger a floresta.
“Biden e o futuro secretário de Estado,
Tony Blinken, entendem duas coisas muito claramente. Primeiro, os desafios globais mais urgentes da nossa época devem ser enfrentados em cooperação com os parceiros dos EUA. Biden disse: ‘América primeiro tornou a América isolada’”, afirma Michael Camilleri, diretor do centro Rule of Law, do instituto InterAmerican Dialogue, e ex-assessor para América Latina durante o mandato de Obama. “Em segundo lugar, eles entendem que a liderança dos EUA ainda é importante e deve ser construída, como disse Blinken, com humildade e confiança”, diz Camilleri.