Quando pegamos o KURO, não sabíamos ABSOLUTAMENTE NADA sobre gatos. Fomos aprendendo no processo. Aprendendo sobre como eram as melhores rações, como era a melhor forma de os manter hidratados. Descobrimos que o ideal seria que eles não fossem pra rua, então, desde o início, tínhamos a nossa casa com telas em todas as aberturas. Compramos os brinquedos e coisas que fomos aprendendo que eles gostavam. Infelizmente, especialmente pra ele, só fomos aprender sobre duas doenças felinas quando já era tarde (FIV / FELV).
O nosso gato, então mais velho, foi premiado com a FELV. Num dia ele estava agindo absolutamente normal, brincando e correndo pela casa com as outras duas gatas que tínhamos à época (só depois que ele morreu que resgatamos a última, presa no topo de uma árvore aqui perto de casa). No dia seguinte, ele deitou num edredon que ficava num canto da casa que deixamos só pra eles, e não levantava de lá. Nas primeiras horas achamos que era apenas preguiça (normal pra eles, gatos). Mas quando servimos a ração e ele ficou lá, deitado, notamos que algo estava errado.
Quando tentei levantar ele, ele miou alto, como se estivesse sentindo dor. Achamos, naquele momento, que ele pudesse ter se machucado de alguma forma, embora não soubéssemos como, já que ele não saia pra rua. Minha esposa chegou a pensar que tinha sido de uma "tropeçada" que ela deu nele num dia antes, quando estava caminhando pela casa à noite e ele se atravessou na frente dela. Só que seria muito estranho, porque foi andando devagar, foi algo leve, difícil ele ficar daquele jeito só com aquilo.
Levamos numa clínica veterinária aqui perto de casa - o que, depois, descobrirmos que foi erro nosso -, e o pessoal tratou como se fosse lesão. Aplicaram uma injeção pra dor, fizeram um raio-x, não viram nada, e mandaram pra casa. Quando chegou em casa, sem dor, logo ele começou a caminhar novamente e, então, pensamos que estaria resolvido o problema. À noite ele voltou a ficar deitado num canto isolado. Até tentava levantar, mas deitava novamente miando de dor. Lembro que era uma noite fria, a gente já estava indo deitar pra dormir e trabalhar no dia seguinte. Levantamos, colocamos uma roupa e levamos ele de novo na mesma clínica. Ele ficou baixado lá aquela noite. Tomou medicações mais pesadas, acompanharam ele durante o dia seguinte, e passou a tomar medicamentos por via oral pra dor. Se alimentou enquanto esteve lá, e então voltou pra casa. Mas tivemos que passar a dar uma medicação pra ele de 12 em 12horas, pra dor.
Quem nunca deu medicamento via oral pra gatos, saiba que não é fácil. Além de tudo, eles ficam espumando pela boca, o que assusta o marinheiro de primeira viagem, mas é "normal". Mas o problema não solucionou. Voltamos lá, fizeram novos exames de imagem, e não descobriram o que era. Mais injeções, mais medicamentos. Só naquela semana, já tinha gasto 2 mil reais naquela clínica, e o problema não melhorava. A Veterinária do plantão, a última que me atendeu, foi sincera e disse que ali eles não tinham nenhum especialista em felinos (que, até então, eu não sabia que existia. Na minha ignorância, "Veterinário" era "Veterinário pra tudo, pelo menos no caso de cães e gatos". Sugeriu uma clínica em Porto Alegre, especialista em felinos. Antes de levarmos ele lá, fizemos o teste de FIV e FELV. Constatamos que ele era FELV positivo. FELV é chamado de "AIDS" felina. Não transmite para humanos, nem para outros animais. É de gato pra gato. Ela ataca o sistema imunológico do bichano e, uma das consequências possíveis é o surgimento de linfomas cancerígenos. Não tem cura, apenas tratamentos. Com essa notícia e pesadas doses de pessimismo da veterinária que nos atendeu, resolvi aceitar a indicação e fui na clínica especializada. Antes de irmos até lá, corri pra casa pra levar nossas outras duas gatas para testar, afinal, a FELV é transmitida através da saliva - e eles se lambem o tempo todo. Por sorte, nossas outras duas negativaram, tanto pra FIV, quanto pra FELV. Isolamos um espaço em nosso quarto para o gato positivo, e providenciamos as vacinas completas para as outras duas (importantíssimo). 30 dias depois voltaríamos a testá-las para descobrir se não tinha ocorrido contágio recente que pudesse não ter sido pego no teste.
Mais uma noite na estrada, levamos ele a essa veterinária especializada em felinos. Outro nível de atendimento; mas também outro patamar de custos. Exames bem mais específicos conseguiram mapear o problema de forma precisa. Num exame com contraste, descobriram que, em decorrência da FELV, o que estava prejudicando e causando dores nele era um linfoma alojado na Medula. Algo um tanto raro, e de solução ainda mais rara. Ainda que a clínica fosse foda, eles deram uma sugestão que, na época, aceitei por confiar nos médicos; mas hoje considero que foi um erro: antes de iniciar o tratamento com quimioterapia para tentar acabar com os linfomas, sugeriram operar pra fazer a remoção do linfoma alojado na coluna. Aceitei. De fato, após a cirurgia ele ficou sem dor, mas até o fim dos dias dele (duraria mais 1 mês, aproximadamente), não conseguiu mais ter o completo controle das patas traseiras, que fraquejavam bastante pra caminhar. Até caminhava, mas cambaleando bastante. Tinha dificuldade de usar a caixinha. Dava uma pena ver ele caminhando, era bem triste e doloroso, ainda mais quando lembrávamos do quão alegre e ativo ele era dias antes. Esperançosos que aquilo pudesse ser revertido com o tempo, pelo menos em nível que permitisse a ele ter uma autonomia e sem dores, demos continuidade ao tratamento, que agora seria de quimioterapia.
A oncologista dele traçou o plano. 3 sessões de químio (1 por semana), e uma semana sem químio para ver a evolução do quadro. Após isto, reinicíavamos o protocolo ajustado a realidade que ele apresentasse.
Fizemos as três semanas de químio. Nas 2 primeiras, ele ainda estava com uma sonda que foi colocada após a cirurgia. No começo tínhamos medo dela, mas depois que aprendemos a alimentar, dar medicações e água por ali, vimos o quanto ela facilitava pra nós, e pra ele. Nessas semanas, aprendemos até a fazer soro subcutâneo em casa (tradução para leigos - como éramos antes disso -: bolsa de soro pendurada em algum lugar alto, caninho sai da bolsa e se prende a uma agulha na ponta, a qual tens que espetar em baixo do couro do gato, mas com cuidado pra não atravessar fundo demais e perfurar algum órgão ou região inferior à camada superficial da pele). Semana a semana ele foi apresentando melhorias pequenas, mas animadoras. Compramos as rações pastosas mais caras, recheadas de nutrientes. Dávamos 8 medicações a cada 12hs. Dávamos água 4 vezes ao dia via sonda. Comida 2 vezes ao dia. Quando ele acordava e tentava ir na caixinha, acordávamos juntos para o ajudar, e para o limpar quando saía dela, porque ele se sujava bastante. Tudo isso tendo que levantar as 6 da manhã pra ir trabalhar. Revezávamos quem voltava em casa no horário de almoço do trabalho pra ver como ele estava, e pra dar água. Deixávamos um notebook com a câmera ligada, e usamos um programa pra monitoramento no celular. Qualquer movimento, a gente via.
Na semana final da químio, ele começou a demonstrar algum desconforto para engolir. Comentamos com a Onco, e ela cogitou que pudesse ser a sonda. Segundo ela, ele já estava com ela a tempo demais, e o melhor seria a remover e trocar por uma nova, ou remover. Ela insistia que tinhamos que tentar remover pra ver como ele se comportaria. Nós, àquela altura, estávamos com medo disso. A sonda realmente ajudava, e dar remédios pra ele, via oral, tinha se mostrado ser difícil mesmo antes do quadro agravar, com apenas UM remédio. Ele, agora, tomava 8. Mas após muita insistência dela, aceitamos. Mais uma noite rodando com ele pra clínica (que fica a mais ou menos 1 hora de carro de nossa casa). Removemos a sonda, e voltamos pra casa. No dia seguinte, ele fez a última químio antes da pausa. Quando voltou pra casa, sério... nós ficamos cheios de esperança. Ele estava muito ativo, caminhando com um pouco mais de firmeza. Parecia que as coisas estavam rumando para um final feliz.
Naquele final de semana começamos a sofrer com as medicações via oral. Pra nosso desespero, ele não queria ingerir comida (entenda - se gato não quer comer, tu não vais conseguir fazer ele engolir ração). Tentamos diluir ração em água pra dar com seringa. Mas a quantidade que ele comia era muito pequena, e ele realmente estava sofrendo naquele processo. Falei com a oncologista, e ela recomendou levar ele de volta no dia seguinte pra recolocar a sonda (por nós, não era pra ter tirado). O problema é que no dia seguinte ele estava muito pior. Deu uma queda absurda de um dia pro outro. Não tinha comido bem nos últimos dois dias. Não tinha bebido água suficiente. Suspeitávamos que algumas partes de medicações pudessem ter sido desperdiçadas entre babas e tosses. Levamos ele na clínica, e, após alguns exames, descobrimos que alguns linfomas estavam se alojando na garganta dele, e que talvez essa fosse a real razão do desconforto que ele apresentava com a sonda, e não o fato da sonda estar lá há muito tempo. Ele ficou baixado. Nem pela sonda estava se alimentando mais. Ficou direto no soro. Daquela baixa ele não voltou mais. Na noite seguinte a esta última baixa, a Onco nos ligou e informou que ele estava mal. Que tinha tido, nas últimas horas, duas paradas cardíacas, e que as enfermeiras o haviam ressuscitado. Mas que o quadro era péssimo e que, se quiséssemos garantir uma visita com ele vivo, tínhamos que ir naquela noite que, embora não fosse horário de visita, ela já tinha combinado com o hospital de nos deixar entrar (o Hospital inteiro nos conheceu nessa história. Foi praticamente 1 mês de idas e vindas quase diárias lá. As veterinárias mesmo comentaram que há poucos casos de estudos como o dele, justamente porque raros tutores estão dispostos a ir tão longe pra salvar o animal - e eu entendo, sem mentira, gastamos, ao todo, o equivalente a um carro popular. E não pense que somos ricos não. Fomos até um pouco além do limite que pudemos. Abrimos mão de muitas coisas e levamos praticamente 1 ano pra nos recuperarmos dos rombos financeiros que abrimos para ir até aquele ponto.
Chegamos lá e ele estava vivo, mas inconsciente. O olhamos, passamos a mão no pelo dele. A onco perguntou se autorizávamos desligar os aparelhos, pois ela já não garantia que, SE ele voltasse a vida, que tipo de gato voltaria. Como até então ele vinha tendo melhoras, fizemos o possível e o impossível para o manter vivo e sem dores. Mas naquele ponto, já era sofrimento. Eu não deixaria ele sofrer mais. Autorizei.
Após esse wall que poucos lerão, deixo apenas algumas recomendações para quem quiser ter gatos:
- Antes de adotar, façam testes de FIV e FELV. Se o felino for positivo pra algum dos dois, só peguem se não tiverem planos de ter mais gatos depois. Saibam que eles podem ser assintomáticos para o resto da vida, mas que, em algum momento, a doença pode aparecer. Ela é cruel, é devastadora, e, se você realmente amar o filhote, você vai gastar bastante no processo. Não digo isso pra desencorajar não! Até porque, como disse, com os devidos cuidados (que hoje conhecemos), evitando estresses, dando boas rações, mantendo hidratados e bem cuidados, há grandes chances do gato ter uma vida inteira sem ser assombrado pelos efeitos da doença.
- Tenha a casa telada.
- Dê as vacinas completas regularmente. FELV tem vacina, caso seu gato não seja positivo (depois de positivado não funciona). FIV não.
- Garanta potes de água espalhados pela casa, e dê sachês com alguma regularidade para seus gatos.
- Acima de todos os riscos, custos e dores de cabeça que podem causar, gatos são seres maravilhosos e recompensam tudo isso.