Por que amamos Jon Jones ( e não você, Daniel)
Obs: texto que escrevi para um site de lutas
Daniel Cormier é um ser humano exemplar. Já era um wrestler de destaque, "all american", quando uma tragédia o acometeu. Algo cujas consequências emocionais nós, que nunca vivemos na pele drama semelhante, podemos apenas imaginar: sua filha, com apenas 3 meses, faleceu em um acidente de carro.
Um acontecimento desses seria o suficiente para abalar em definitivo qualquer pai com um mínimo de coração, ainda mais sendo desses verdadeiros " paizões", mais emotivos e apaixonados por seus filhos, como hoje se sabe ser o caso de Daniel. Na realidade, não surpreenderia se o fato o tivesse incapacitado de continuar disputando qualquer competição desportiva em alto nível, já que exigem muitíssimo da cabeça no lugar.
Só que não, Daniel não desistiu. Tampouco se vitimizou. Pelo contrário: como ele mesmo sempre diz, fez daquela chaga em sua vida verdadeiro combustível, algo que sempre o motivou a chegar mais longe. Hoje ele dedica à memória de sua filha morta as inúmeras vitórias de uma carreira vitoriosa. Limpo, o atual campeão da mais disputada categoria do UFC enfrentou os melhores lutadores do mundo, sem perder para qualquer deles. A não ser para Jon Jones.
Jon Jones...um homem cuja habilidade como lutador está fora de questão ( se existe algum " Pelé das artes marciais mistas", ei-lo), mas cujo comportamento " fora dos ringues" é cercado de polêmicas. Dentre outras confusões, o “Bones” envolveu-se em: acidente em que dirigia embriagado;em outra ocasião, fugiu de local de acidente que provocara, ferindo uma mulher grávida- sendo que depois ainda foram encontrados vestígios de maconha no seu carro; isso além de ter sido flagrado no antidoping,mais de uma vez ( hoje se encontra até suspenso).
Pois foram esses dois tipos, bem distintos, de homens, que ingressaram no Madson Square Garden, em 2015 e, depois, no Honda Center, no ano de 2017.
E, em ambas hipóteses, não foi o “ bad boy” Jon Jones que foi vaiado ao entrar; e não foi o “ bom moço” Daniel que foi ovacionado; mas, precisamente, o contrário.
Como? Por quê? Acaso as pessoas estão se tornando todas más, a ponto de simpatizarem com encrenqueiros, em detrimento das pessoas “corretas”?
Esses foram questionamentos que, em tom queixoso, Daniel fazia, em entrevista concedida para jornalistas durante a promoção do The Ultimate Fighter. E não teria ele razão?
Eu mesmo respondo: não, Daniel. O fato de amarmos Jon Jones , e não você ( ou não tanto você), o fato de termos torcido por ele naquelas lutas contra você, não significa que estejamos todos assinando um atestado de perversidade. O que acontece, Daniel, é que não gostamos de caricaturas. Não suportamos caricaturas, para ser mais preciso.
Quando você saiu publicamente se queixando do comportamento do seu adversário, como que pretendendo sustentar uma retidão moral, que colocasse você em condições de repreendê-lo, a única imagem que construiu de sua pessoa, Daniel, foi a de uma caricatura. Uma caricatura de bom moço. Uma caricatura de pai zeloso. Uma caricatura de ser humano exemplar.
Daniel, muitos dos que deixaram de apoiá-lo, depois disso, fizeram por não conseguirem enxergar nesse comportamento algo tão genuíno. Sabe por quê? Porque eles são humanos. Eu sou humano, Daniel. E, como humanos- a seu exemplo, veja só!-nós não somos perfeitos. Nós falhamos. Compreendemos, portanto, quem falha.
Isso não quer dizer que nós aplaudamos criminosos. Não quer dizer, mesmo, que consideremos louváveis as escorregadas do Jon Jones. Significa, apenas, que as perdoamos. E, apesar delas, nós gostamos do cara. Porque o Bones é humano, a nosso exemplo. E porque é autêntico: ao contrário de você, ele não finge ser infalível.
Jon Jones não é, afinal de contas, nenhuma caricatura. Ele é um cara que se mete em algumas encrencas, como muitos de nós nos metemos. Mas, a par disso, é um sujeito extremamente carismático. Quem viu a interação dele com a Laura Muller, no programa do Groissman, pôde comprovar. Como, de resto, demonstra o quanto esse cara é gente boa sua conduta com os fãs, com as pessoas na rua, de modo geral.
Se Jones fosse eminentemente mau, se cometesse crimes sérios, ou tivesse uma postura de fato detestável, ele seria uma caricatura: caricatura de um cara do mal. E nós o odiaríamos, ao natural. Como todos odiamos um Colby Covington, por exemplo.
Enfim, Cormier, se hoje muitos o criticam, como você faz questão de alardear, atribuindo essa súbita antipatia aos confrontos com o Jon Jones, fazem porque você “ caricaturizou” sua própria imagem.
Caso queira recobrar a nossa simpatia, não fique que nem um bebê chorão, criticando Jon Jones por ser um “ drogado”. Apenas assuma que o odeia, e prometa descontar essa raiva no cage. Ou admita não ser capaz( o que pode gerar bem menos frustrações).