Como eu venho mencionado há alguns dias. Por não ser um político, Velez está totalmente perdido no ministério da educação, um dos mais contaminados.
O incrível caso do Ministro de Estado que se tornou Ministro do Estadão
Silvio Grimaldo
Depois da notícia dada pelo Estadão ontem, criticando funcionários da ala bolsonarista do MEC que iriam participar de uma reunião da OCDE em Paris, o ministro Vélez, mais uma vez, comete um erro e cancela a viagem. Está lá no Diário Oficial de hoje. Com o recuo, ele sinaliza que é fraco, vulnerável que e está inteiramente na mão de jornalistas que o querem derrubar.
Infelizmente, parece que ao ministro não importam mais as diretrizes do governo, nem do MRE, e sim o que a Veja e o Estadão estão falando dele. Em suas decisões atuais, uma notícia da Folha de ontem pesa mais do que o plano do amanhã que o Presidente da República tem para Brasil.
O MEC está paralisado porque o ministro está paralisado. Sem plano de ação, desorientado e cada vez mais afundado num isolamento paranóico, o professor Vélez só reage ao que a mídia lhe joga na cara, mas nunca age por iniciativa própria. Está completamente pautado. A mídia lhe cola um framming por dia. Bolsonaro, com apoio de Trump, estabeleceu novas metas de participação do Brasil junto à OCDE, num realinhamento total da nossa política externa. O Brasil, agora, almeja seriamente, apoiado pelos EUA, tornar-se membro da organização, que é responsável, entre outras coisas, pelo PISA, a avaliação educacional mais importante e séria do planeta, e na qual o Brasil amarga os últimos lugares desde sempre. O governo já havia solicitado em 2018 o status de associado ao CERI e ao EDPC, as duas instâncias de reuniões das quais a comitiva do MEC iria participar. Isso é um passo fundamental para a entrada do Brasil na OCDE. O CERI é o principal think thank educacional do mundo, e seria uma excelente oportunidade para governo Bolsonaro tentar integrar seu Comitê de Governança, órgão que define rumos educacionais da maior parte dos países membros. Mas os “técnicos do MEC” aparentemente têm outros planos.
Em meio à paralisia do MEC e à incapacidade do ministro de decidir que rumo tomar, a Assessoria Internacional do Ministério continuou fazendo seu trabalho e seguindo o que recomenda o MRE. A viagem não era nenhuma novidade para o ministro, ele estava plenamente informado e já havia concedido afastamento aos seus assessores.
A única coisa que mudou nessa história foi o surgimento da matéria do Estadão, acusando o MEC de pagar uma viagem a Paris para alunos do Olavo de Carvalho, como se os funcionários estivessem indo lá para tomar vinho e comer queijo na beira do Rio Sena, e não para cumprir suas obrigações com o MEC, com o governo e com os eleitores de Jair Bolsonaro. A pressão jornalística foi a razão suficiente para Vélez se encontrar mais uma vez intimidado pelo bicho-papão da mídia, ignorar a presidência e retroceder.
A extrema-imprensa anti-bolsonarista, sabendo agora que ele não aguenta pancada e que cede fácil, não vai parar de bater. Paulo Saldaña deve ter colocado uma garrafa de espumante na geladeira, esperando pelo dia do desembarque! Não gosto de fazer previsões, mas não me surpreenderia se o Presidente o demitisse ainda nessa semana, ou se o próprio ministro entregasse os bets antes do final do mês.
No auge da crise do MEC, durante o carnaval, quando o ministro decidiu afastar de perto de si os funcionários mais firmes na execução das promessas de campanha e mais afinados com as mudanças exigidas pela nova política do Presidente Bolsonaro, eu ainda acreditava que o professor tinha plenas condições de tocar o ministério e fazer uma boa gestão. Ele cometera um erro, mas era possível arrumar a casa, resgatar sua autoridade e colocar o MEC nos eixos. Vélez, contudo, continuou cometendo os mesmos erros, seguindo o mesmo padrão de decisão, baseado no mesmo tipo de avaliação equivocada das forças políticas que realmente importavam dentro e fora do MEC.
A sucessão de fracassos ao nomear o secretário executivo, ao manter seu assessor parlamentar, um conselheiro que faz Iago parecer o melhor amigo de Otelo, e ao tentar remontar o gabinete tendo como critério agradar e satisfazer grupos de pressão, sem contar a tentativa de comprar favores bancada evangélica sem consultá-la, que resultou em mais animosidade entre a bancada e o governo, foi deixando claro que ele continuava (e continua) influenciado pelo mesmo grupo que o cercava antes de começarem os expurgos carnavalescos, grupo que o meteu nessa enrascada e que não consegue achar uma saída viável.
O erro é basicamente o mesmo: tomar decisões importantes baseado em conjecturas políticas amadoras e delirantes, ao invés de consultar a Presidência da República e se orientar pelas diretrizes do governo. Como ia dizendo, no auge da crise, eu ainda acreditava em sua capacidade de liderar o processo de mudança de rumos pelo qual o MEC precisa passar se quisermos realmente mudar o destino da educação brasileira. Essa esperança, hoje, já não a tenho mais.
Continuo admirando sua obra teórica, que é uma peça essencial para compreender a história política do país e a nossa situação atual. Ainda é de Vélez Rodriguez o estudo mais importante sobre as origens do movimento revolucionário positivista no Brasil, que ainda influencia a maior parte dos militares em cargos-chaves do governo. É dele também a melhor tentativa de compreender como o socialismo sindical do PT se fundiu com a tradição patrimonialista das oligarquias tradicionais para criar uma jabuticaba toda nossa: o patrimonialismo lulo-petista. Mas não vejo futuro para o professor Vélez como ministro da educação. Sem autoridade, sem equipe, sem planejamento estratégico, sem programas, acuado, amedrontado, desconfiado, paranóico, incapaz de tomar decisões técnica e politicamente fundamentadas, sem compreender a natureza do novo governo e incapaz de colocar sua obra teórica de vida inteira, o combate ao patrimonialismo e ao estamento burocrático, em prática, não resta outra alternativa ao professor Vélez senão entregar o cargo. Ele não tem mais condições mínimas de continuar à frente do MEC. Precisamos de um ministro que trabalhe pelos interesses do Estado, não um que trabalhe pelos interesses do Estadão.
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O escritor é amigo pessoal do Velez e já chegou a trabalhar no MEC mas pediu pra sair quando viu que não tinha jeito.