Não existe 'imposto sobre o consumo'. Existem impostos que impactam no preço final de um produto a ser consumido.
Um presidenciável (ou um pretenso que irá fazer parte da equipe econômica dele) não pode prometer que irá reduzir 'imposto sobre consumo', porque existem tributos que impactam no preço de um produto que sequer estão na competência da União mexer. Discurso tão raso e populista quanto o de um candidato a vereador dizendo que vai melhorar a segurança, construir universidades e criar empregos pra população.
http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=3233&catid=30&Itemid=41
As distorções de uma carga tributária regressiva
2015 . Ano 12 . Edição 86 - 28/03/2016
Carga tributária se mantém constante em relação ao PIB nos últimos dez anos, mesmo com expressivas políticas de desoneração para empresas. A proporção é mantida por meio do aumento da taxação sobre salário e consumo
Marcel Gomes – São Paulo
Os tributos sobre a folha de salários e os rendimentos do trabalho, puxados pela expansão da massa salarial e do nível de emprego formal, ajudaram a garantir a manutenção da carga tributária ao redor de 33% do PIB entre 2005 e 2014. Isso se deu apesar de todas as desonerações que ocorreram no período. Só a participação dos impostos sobre a folha, por exemplo, cresceu 24% nesse período, passando a responder por 2,65% do PIB.
O Brasil possui uma carga tributária equivalente à média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 33% do PIB. Após um período de crescimento, ela vem se mantendo estável desde 2005 em termos de percentual do PIB. No entanto, pouco mudou em sua característica de tributar pouco a renda e o patrimônio, e de fazê‑lo de maneira regressiva sobre salários e consumo.
Dados calculados pelo economista do Ipea Rodrigo Octávio Orair, no Texto para Discussão (TD) Desonerações em alta com rigidez da carga tributária: o que explica o paradoxo do decênio 2005‑2014?, publicado em agosto de 2015, revelam a importância do mundo do trabalho para a arrecadação de impostos.
Além dessas receitas, tributos sobre importações e lucro de pequenas e médias empresas avançaram 2% do PIB, entre 2005 e 2014. Eles compensaram a queda dos impostos sobre o lucro das empresas, que contribuíram para reduzir a carga em 2,3 pontos percentuais.
CARGA REGRESSIVA
O caráter regressista é a marca essencial do sistema tributário brasileiro Em português claro, quem tem mais paga menos. A maior penalização dos mais pobres é sintetizada pelos seguintes itens:
• O excesso de tributação sobre bens e serviços, de 18,8% do PIB, maior do que em qualquer país da OCDE, onde a média é de 11,6% do PIB.
• A isenção total de imposto de renda sobre lucros e dividendos distribuídos a acionistas de empresas, o inverso do que faz a maioria dos países.
• A possibilidade de se deduzir do lucro tributável uma despesa fictícia relativa aos chamados “juros sobre capital próprio”.
Só o custo dessas duas últimas “jabuticabas”, na expressão de Rodrigo Orair, alcança R$ 50 bilhões por ano. “Isso contribui para concentrar renda nos extratos superiores, já que o rendimento dessas famílias provém, principalmente, da propriedade do capital”, explica.
Por se tratar de fruta nativa do Brasil, a jabuticaba entrou no dicionário político‑econômico como algo marcado pela excentricidade, um produto único e genuíno desta parte do mundo.
INCIDÊNCIA NAS FAMÍLIAS
Inspirados em O capital no século XXI, livro do economista francês Thomas Piketty, Orair e seu colega de Ipea Sérgio Gobetti têm se debruçado em análises sobre como a carga tributária incide sobre as famílias brasileiras. Em 2015, a Receita Federal finalmente disponibilizou informações detalhadas sobre a declaração de renda das pessoas físicas.
Orair destaca que a arrecadação avançou 10 pontos percentuais do PIB em um curto período, partindo de um patamar próximo a 23%, em 1988, para superar 33%, em 2005. E ressalta: “No decênio 2005‑2014, a carga passou a oscilar ao redor de 33,4% do PIB, sem evidenciar uma tendência expansiva”.
Em seu TD, Orair sublinha: “Ressalte‑se ainda que o declínio recente dos impostos que incidem mais tipicamente sobre as grandes empresas foi bastante expressivo (‑0,96% do PIB durante 2008‑2014).
Apesar de a carga total ter se mantido na mesma proporção do PIB nos últimos dez anos, a partir da crise internacional de 2008, o governo federal promoveu expressivo pacote de desonerações anticíclicas. Isso envolve redução de alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de bens durá‑veis e materiais da construção civil e do IOF sobre crédito das pessoas físicas. O objetivo era buscar reativar a atividade econômica, o que acabou não acontecendo.
O trabalho de Orair sublinha que “impostos sobre a renda, lucro e ganhos de capital – pessoa jurídica [sofreram...] queda de 0,23% no decênio 2005‑2014”, por terem sido “alvo de inúmeras desonerações tributárias”.
O percentual da carga total em relação ao PIB foi mantido porque as desonerações foram compensadas pela cobrança de “tributos com a característica comum de incidirem principalmente sobre os rendimentos do trabalho”, afirma o texto. Mais adiante, Orair conclui:
“Outro fenômeno tributário importante são as desonerações de contribuições previdenciárias do período 2011‑2014, obtidas por meio da redução de alíquotas, com substituição da base de incidência da folha de pagamento para a receita bruta de determinados setores produtivos, que colaboraram para que as contribuições sociais deixassem de crescer em proporção do PIB no período mais recente”.
De acordo com a pesquisa, “a tributação sobre lucro incidente, principalmente nas grandes empresas, e os impostos sobre bens e serviços reduziram a carga (‑2,28 p.p. do PIB) e são os agrupamentos que concentraram a maior parte das mais significativas desonerações tributárias”.
Juros e política fiscal
Economista avalia que déficit do setor público tem origem na Selic elevada
Diante da queda da arrecadação e da dificuldade para executar a meta de superávit em 2015, a política fiscal foi colocada no centro da atual crise econômica brasileira.
O governo federal busca encaminhar soluções tanto do ponto de vista da receita – aumento de impostos – quanto da despesa – corte de gastos –, como determina o manual do “mainstream econômico”. Mas há dificuldades no Congresso.
O atual impasse poderia abrir espaço para o debate de propostas que fujam do lugar-comum. O consultor Amir Khair, por exemplo, defende que as autoridades econômicas voltem o olhar para a política monetária. Na avaliação dele, as dificuldades fiscais do país têm relação com o atual nível da taxa Selic, acima de 14% ao ano. “Eu calculo que 98% do déficit do setor público têm origem nos juros altos, e só 2% é déficit nominal”, diz Khair.
Os juros não caem, na visão do consultor, porque o setor financeiro se beneficia das taxas mais altas e tem enorme influência da condução da política econômica. “Eles deslocam todo o debate para a política fiscal porque estão se beneficiando com a política monetária”, afirma.
Khair ressalta que os efeitos da Selic no combate à inflação são mínimos, diante da própria composição dos índices de preços. Ele diz que, no caso do IPCA, os serviços representam 35% e os preços monitorados, outros 23% – dois setores praticamente imunes à alta dos juros.
Na mesma linha, o professor titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA‑USP) Carlos Antonio Luque afirma que os prejuízos dos juros altos já são maiores do que os benefícios.
“É espantoso como se fala pouco sobre o papel da taxa de juro atual no endividamento público, sobretudo quando o seu efeito sobre a inflação passa a ser muito reduzido”, critica ele, que preside a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
FALTA DE TRANSPARÊNCIA
Reprodução
Vale lembrar que o Brasil ficou de fora dos estudos de Piketty, sob a alegação de que não havia transparência nesse tipo de dado no país. Com as novas informações disponíveis, porém, foi possível estratificar os declarantes por faixas de rendimentos, revelando que até 71.440 deles apuraram ganhos superiores a R$ 1,3 milhão – o extrato 0,05% mais rico da população.
Os estudos do Ipea mostram que o Brasil realmente pode ser visto como um paraíso fiscal para famílias mais abastadas. Segundo Orair, tributos incidentes sobre a propriedade, como IPTU, representam apenas 1,2% do arrecadado no país, ante 1,8% da média na OCDE.
A carga brasileira sobre rendas, lucros e ganhos de capital responde só por 6,9% do total, contra 11,5% na média da OCDE. Considerando a população mais rica, a alíquota média cresce até 12% no início do último centésimo da distribuição de renda, e cai até 7% entre os 0,05% mais abastados.
INCENTIVO À TERCEIRIZAÇÃO
A tributação total das empresas varia de 16,33% a 19,53% do faturamento no regime de lucro presumido, ou de 4,5% a 16,85% se estiver no regime Simples. Nos países da OCDE, a média de tributação total sobre o lucro atinge 43,1%, e de maneira mais equilibrada entre pessoa física e pessoa jurídica.
“É um incentivo à terceirização e à ‘pejotização’”, diz Orair. Dos 71 mil brasileiros mais ricos, 51 mil receberam dividendos em 2013. Ainda segundo o economista, apenas a Estônia, na OCDE, isenta totalmente os lucros e dividendos distribuídos, e México e Eslováquia decidiram restaurar essa tributação há pouco tempo.
A tributação sobre bens alimentícios, por exemplo, não “distingue” o consumidor mais rico de outro mais pobre. No Brasil, a carga sobre bens e serviços responde por 15,7% do total arrecadado, ante 10,9% na média da OCDE e 10,7% no México – a segunda maior economia da América Latina.
As jabuticabas tributárias brasileiras também têm chamado a atenção do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), uma ONG sediada em Brasília que se dedica, entre outros alvos, à luta por justiça fiscal.
Lançado em 2014, um estudo da entidade aponta que, diante da regressividade de nossa carga tributária, as mulheres negras tornam‑se o setor da sociedade mais atingido por esse sistema. Isso ocorre, segundo a assessora política do Inesc, Grazielle Custódio David, justamente porque elas se concentram nos extratos de menor renda da população.
Considerando os dados da Pnad de 2011, 65% das mulheres negras recebiam até R$ 700 por mês, e 54% da população negra em geral. Essa porcentagem decresce para 34% da população branca em geral.
“Os pobres, em especial parcela importante das mulheres negras, são a população que proporcionalmente mais paga impostos. Ao mesmo tempo, eles demandam mais políticas públicas, mas não obtêm o retorno de que necessitam”, ressalta Grazielle.
OBJETIVOS DISTRIBUTIVOS
Na avaliação de Orair, o estado da arte tributário tem sido historicamente moldado para se abster dos objetivos distributivos, transferindo ao gasto público essa função clássica da política fiscal. “Em 1988, o governo Sarney reduziu a alíquota máxima do IRPF de 50% para 25%. Contraditoriamente, a Constituição de 1988 estabeleceu as bases do Estado de bem‑estar social”, relembra o pesquisador do Ipea.
Mais tarde, em 1995, o governo Fernando Henrique Cardoso finalmente isentou os lucros e dividendos. Era o ápice da tendência iniciada na década de 1980 de reversão da progressividade, com redução das alíquotas máximas do imposto de renda e das rendas do capital, a fim de não distorcer incentivos econômicos.
Nessa suposta busca pela eficiência, a receita foi copiada tanto por países ricos quanto pelos futuros emergentes. Mas nem os Estados Unidos, polo para concepção e difusão do novo ideário, foram tão fundo no regressismo fiscal como o Brasil.
Lá, o presidente Ronald Reagan reduziu a alíquota máxima de imposto de renda de 70% para 50%, e depois 33%. Em 2003, foi a vez de George W.Bush tentar isentar os dividendos das empresas, mas só conseguir reduzi‑los para 15%.
Diante do fato de que o Brasil seguiu essa tendência como nenhum outro país, o professor titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA‑USP) Carlos Antonio Luque afirma que o sistema tributário brasileiro tem violado um princípio básico: o de quem ganha mais, paga mais.
O caminho para a progressividade, entretanto, esbarraria no interesse das unidades federativas, que temem a perda de arrecadação. “O debate entre União, estados e municípios avança pouco pelo receio de perder receita. Nós sabemos onde estamos, sabemos onde queremos chegar, o problema é a travessia”, ilustra Luque.
DIFICULDADE PARA MUDAR
Bruna Menezes
Além da dificuldade de entendimento entre as autoridades públicas, o consultor Amir Khair acrescenta que grupos de interesse dificultam mudanças no sistema. “Houve várias tentativas de reforma tributária desde 1988. Discute‑se sempre sobre quem vai ficar com os recursos, mas nunca sobre quem é que pagará a conta”, diz ele, que foi secretário de Finanças da prefeitura de São Paulo (1989‑92).
Para Orair, do Ipea, a conta deve ser paga pelas camadas de maior renda da população, através de reformas rumo a uma maior progressividade. O economista defende como fundamental o retorno da tributação sobre lucros e dividendos, aumentando o poder distributivo do sistema tributário.
Sem isso, ele calcula que a “pura e simples” criação de alíquotas adicionais do imposto de renda da pessoa física não atingiria os mesmos resultados em termos de progressividade e igualdade. “Muitos defendem que, para tributar as pessoas físicas, basta aumentar as alíquotas, mas dois terços da renda dos milionários simplesmente não são tributados na pessoa física, pois chegam via lucros e dividendos”, diz.
A eliminação das jabuticabas brasileiras passa, também, por outras mudanças na composição da carga tributária que a alinhem ao padrão internacional. “Precisamos tributar menos bens e serviços e explorar mais o patrimônio, como IPTU e IPVA”, acrescenta Orair.
O economista defende que a progressividade tributária é uma alternativa ao ajuste fiscal. Ele destaca que o retorno da tributação de lucros e dividendos das empresas a um patamar de 15% traria R$ 43 bilhões por ano ao caixa do governo.
É um valor superior aos R$ 32 bilhões esperados com o projeto da CPMF, diz ele, sublinhando que a medida aumentaria a tributação das famílias mais ricas, ajudando no combate à desigualdade social.
-------------------------------------------------------
https://g1.globo.com/economia/notic...ibutos-que-os-10-mais-pobres-diz-estudo.ghtml
Super-ricos pagam menos tributos que os 10% mais pobres, diz estudo
Relatório da Oxfam divulgado nesta segunda-feira (25) mostra que o topo da pirâmide destina 21% de sua renda com impostos, enquanto os menos favorecidos pagam 32%.
Por Taís Laporta, G1
25/09/2017 09h45 Atualizado 25/09/2017 12h11
Renda mais baixa paga a maior parcela de impostos indiretos no Brasil, mostra relatório da Oxfam (Foto: Felipe Souza/BBC Brasil)
A população 10% mais rica do Brasil paga uma parcela menor de sua renda com tributos que os 10% mais pobres, mostra um estudo sobre desigualdade divulgado nesta segunda-feira (25) pela organização não-governamental britânica Oxfam.
A parcela mais pobre da população gasta 32% de tudo o que recebe em tributos, enquanto quem está no topo da pirâmide destina apenas 21% de sua renda para pagar impostos, segundo o relatório “A Distância que nos Une – Um Retrato das Desigualdades Brasileiras".
No Brasil, a renda mais baixa também é a que paga mais impostos indiretos (cobrados sobre produtos e serviços): 28% de tudo o que ganham os mais pobres é consumido para este fim, enquanto que os mais ricos pagam somente 10% do rendimento neste tipo de imposto.
Os negros e as mulheres são os mais penalizados por essa diferença, mostra o estudo da Oxfam, já que eles somam três de cada quatro brasileiros na faixa menos favorecida. Na outra ponta, os homens brancos são dois em cada três dos 10% mais ricos do Brasil.
Imposto de renda e patrimônio
Quando se trata de impostos sobre a renda e patrimônio, o abismo entre ricos e pobres também é grande. Quem ganha 320 salários mínimos por mês paga a mesma alíquota efetiva de
Imposto de Renda (após descontos, deduções e isenções) de quem recebe cinco salários mínimos, aponta a Oxfam.
Isso acontece porque a alíquota do IR para de crescer para quem ganha acima de 40 salários mínimos. Os mais ricos – boa parte empresários e acionistas – são também os mais beneficiados com as isenções sobre lucros de empresas e dividendos de ações. Na prática, apesar de ser uma renda, eles não precisam pagar imposto sobre estes ganhos, destaca o estudo.
Isenções beneficiam os mais ricos
O estudo aponta, ainda, citando dados da Receita Federal de 2016, que quem tem renda acima de 80 salários mínimos mensais (R$ 63.040) é beneficiado com isenção média de 66%. Para os que ganham 320 salários (R$ 252.160), o benefício vai a 70%.
Na outra ponta, a isenção para a classe média – quem recebe entre R$ 2.364 e R$ 15.760 é de 17%, e cai para 9% para quem ganha entre 1 e 3 salários mínimos mensais (R$ 788,00 a R$ 2.364,00), segundo o estudo.
Desigualdade salarial
O estudo também mostrou que a
desigualdade salarial entre homens e mulheres só vai chegar ao fim daqui a 30 anos. Para chegar ao cálculo, a entidade usou a velocidade com que essa distância diminuiu em 20 anos, levando em conta os dados da Pnad Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Ou seja, a projeção considera que esse ritmo seria mantido.
Se antes as mulheres recebiam 40% do rendimento dos homens, duas décadas depois elas passaram a ganhar 62% do que eles recebem, sobretudo com a entrada delas no mercado de trabalho, aponta a Oxfam. A renda média do sexo masculino, em 2015, era de R$ 1.508,00, contra R$ 938 das mulheres.
---------------------------------------------------------------------------
https://www12.senado.leg.br/noticia...asil-virou-paraiso-fiscal-para-os-muito-ricos
Participantes de audiência afirmam que Brasil virou paraíso fiscal para os muito ricos
Sergio Vieira | 09/03/2018, 17h00 - ATUALIZADO EM 09/03/2018, 17h07
Edilson Rodrigues/Agência Senado
Entidades cobram correção na tabela do IR e alertam que defasagem prejudica pobres
00:00
O Brasil continua insistindo num modelo tributário completamente distorcido, sem paralelo no mundo, que na prática pune as classes média e baixa assalariadas, enquanto isenta as rendas e dividendos de quem é muito rico.
Este foi o tom da audiência realizada pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta sexta-feira (9), no ciclo que discute o modelo fiscal brasileiro.
Uma das maiores distorções presentes hoje, segundo o presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Anfip), Floriano Martins, são as políticas de isenção voltadas para setores empresariais, adotadas já há alguns anos. Somente em 2016, de acordo com os dados mais recentes da Receita, estas isenções foram responsáveis por um rombo de 24% na arrecadação potencial.
- É preciso conscientizarmos a sociedade de que simplesmente não é mais possível mantermos estas benesses. Por causa do déficit, o governo opta por uma forte redução nas despesas e nos direitos sociais, afetando fortemente a prestação de políticas públicas - criticou.
Também com base nos levantamentos oficiais da Receita, Martins ressalta que a sonegação fiscal já gira em torno de R$ 500 bilhões por ano.
Isenção para lucros e dividendos
Também foi muito criticado pelos participantes da audiência o fato do Brasil, ao contrário do que fazem por exemplo os Estados Unidos e a Europa, isentar de impostos a distribuição de lucros e dividendos.
O presidente da Unafisco (outra associação que representa os auditores fiscais), Kleber Cabral, fez questão de ressaltar que o Brasil é a única economia relevante em todo o mundo a adotar este tipo de abordagem.
Outro ponto na legislação que beneficia os muito ricos, segundo a Unafisco, é a possibilidade do tributo na pessoa jurídica recair sobre o lucro presumido, em vez do lucro real.
- O que ocorre na prática é que os controladores das empresas acabam escapando do Imposto de Renda (IR), tanto na pessoa física quanto na jurídica. É perfeitamente possível o lucro contábil maior que o tributável. Então no Brasil as grandes empresas não pagam imposto, mas distribuem lucros. A distribuição de dividendos é 50% maior que os lucros tributáveis - apontou.
Além disso, os levantamentos da Receita "já mostram à exaustão" que um grande número de companhias já vem pulando de Refis em Refis, conseguindo assim também escapar dos débitos tributários. Como solução para este quadro, a Unafisco informa que fechará até abril uma proposta de integração tributária na abordagem entre pessoas físicas e jurídicas, buscando evitar com isto o que chama de "bi não-tributação".
Outro ponto positivo da integração tributária, segundo Cabral, é diminuir a "pejotização" no mercado de trabalho, fenômeno que a Unafisco vê com preocupação devido a seu impacto na base arrecadatória.
Ainda no que se refere à tributação de lucros e dividendos, o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sindifisco), Cláudio Damasceno, apresentou um estudo indicando que caso a diretriz voltasse a ser adotada, aumentaria a arrecadação aos cofres públicos em R$ 30 bilhões anuais. Dentro deste cenário, ele inclui ainda a tributação das remessas ao exterior.
"Quem ganha mais, paga menos"
Também com base em dados oficiais da Receita, o presidente do Sindifisco que representa os auditores fiscais nos estados, Charles Alcântara, mostrou que quem ganha até dez salários mínimos por mês, tem um percentual de isenção em torno de 13,5% da renda.
Já para quem ganha entre dez e 40 mínimos, a isenção chega a 26%. Já para os que recebem entre 40 e 60 salários, faixa que pega os beneficiados por lucros e dividendos, a isenção já atinge 49%.
- Mas a absoluta inversão do modelo tributário não para por aí. A Receita mostra que pra quem recebe mais de 160 salários mínimos por mês, a isenção já chega a 67,2%. Aqui, quanto mais se ganha, menos imposto se paga - lamentou.
O representante da Receita no debate, Claudemir Rodrigues, também vê com preocupação o "crescente desequilíbrio" no modelo tributário. O fenômeno da "pejotização" vem ressaltando cada vez mais uma arrecadação focada sobre quem é assalariado de grandes companhias, em servidores públicos e nos militares, pois são descontados na fonte.
A proposta de reforma tributária do governo, que tem como relator o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), ainda foi criticada por Alcântara por a seu ver não alterar a estrutura hoje vigente, "que pune os assalariados e incide demasiadamente sobre o consumo".
A reunião foi conduzida pelo vice-presidente da CDH, Paulo Paim (PT-RS), que defendeu entre outras medidas o reajuste nas tabelas do Imposto de Renda (defasada em quase 90%, se comparada a 1996), a tributação sobre as grandes heranças e um combate mais forte à sonegação.