POLTRONA 36
Grêmio do frangueiro Tavarelli: delírio do muquirana Obino
O ápice do desgoverno tricolor foi a permissividade sobre a indisciplina no futebol do Grêmio, só para ver que, nesse sentido, todos os clubes caem por conta disso. Apesar da absurda derrota de 1 a 0 para o Paraná, em Curitiba, em 6 de novembro, que afundou o time na lanterna do Brasileirão e, àquela altura, com apenas 1% de chances de escapar da segunda divisão, o clima foi de festa entre alguns jogadores na viagem de retorno. Festa e promiscuidade. Hélio Dourado, cuja declaração veiculada pela imprensa local pode ser ligada a fatos que vieram à luz no fim de 2004, o colocam como protagonista de um dos episódios mais espúrios de toda a história da decadência do Grêmio. "Vi coisas que jamais pensei que veria. Esse cavalheiros não poderiam vestir a camisa do Grêmio, tiveram problemas de comportamento. Não vou falar os nomes por respeito aos profissionais, não quero atrapalhar a carreira de ninguém".
Mesmo confidenciando os escândalos, nada impediu que um colunista da imprensa local revelasse o que se tornou notório após a posse do novo presidente do Grêmio, Paulo Odone (aliás, um dos nomes que fechou em torno de Obino como presidente, em 2002, segundo o site da Zero Hora). Mesmo tentando evitar qualquer vazamento de informações, Dourado não disse os nomes dos atletas mais indisciplinados. A espada de Dâmocles pendeu sobre a cabeça do ex-presidente depois que ele disse que jamais iria tolerar indisciplina em sua gestão. Não só tolerou, quanto permitiu que um jogador permenecesse como laranja podre no grupo. Ele é considerado um dos protagonistas de um dos maiores escândalos do ano de 2004. O fato de afirmar que viu coisas que jamais veria o tornou testemunha principal da vergonha e da promiscuidade gremista, que transformou o Trovão Azul num suave e lírico lupanar.
"FESTA NO APÊ"
O ex-dirigente apenas descreve episódios, como o ocorrido na volta, via rodoviária, de Curitiba, no ônibus do clube, o Trovão Azul, de dois andares. Segundo matéria do jornal Zero Hora, durante o jantar, um pequeno número de jogadores bebeu cerveja em um restaurante à beira da estrada. No retorno ao ônibus, o andar de baixo do veículo - espaço com mesas para jogar cartas, aparelhos de som e TV - transformou-se em uma farra, enquanto integrantes da comissão técnica, dirigentes e a maioria dos atletas tentava descansar no andar de cima. Outro episódio parecido aconteceu depois da goleada de 6 a 1 sobre a Ponte Preta, em Pelotas, em 13 de novembro. No caminho para Porto Alegre foi desencadeada, novamente no andar de baixo do ônibus, uma comemoração que teve até a dança funk "Egüinha Pocotó" e "Festa no Apê", do loser Latino. A indisciplina acompanhou o Grêmio durante a temporada e se intensificou a partir da chegada de Dourado, em junho, junto com o técnico Plein. O ex-vice de futebol preferiu trabalhar sozinho durante os últimos seis meses do ano, sem auxílio de um diretor, apenas com o superintendente Antônio Carlos Verardi. Apesar de seu estilo enérgico e do discurso forte que deu no vestiário quando assumiu, dizendo que não aceitaria indisciplina, o dirigente teve problemas para controlar o grupo e até para se fazer respeitar.
A pior cena vista por certo dirigente ocorreu dentro do Trovão Azul. Incomodado com o ruído provocado plos jogadores no andar de baixo, ele decidiu dormir no fundo do veículos, a fim de não ser incomodado pelo burburinho dos gremistas arruaceiros. Ao chegar na poltrona 36, ele havia testemunhado uma cena de homossexualismo explícito ocorrida por dois jogadores do grupo, que se masturbavam mutuamente. Dois titulares da zaga gremista, hoje afastados.
Outro caso foi o de Felipe Melo é um exemplo dos problemas de mau comportamento de jogadores do Grêmio. O volante costumava cruzar por Dourado sem cumprimentá-lo, o que obrigou o dirigente a uma atitude extrema. Em outubro, durante a concentração do Grêmio em Bento Gonçalves para o Gre-Nal do Estádio Olímpico, o vice de futebol chamou Felipe para uma conversa olho no olho no hall: "não preciso da tua amizade, mas não abro mão da educação. Sou teu chefe e tu tens que demonstrar um mínimo de civilidade. Tu vais me cumprimentar, sim - cobrou o dirigente". Antes, em fins de setembro, os laterais Michel Bastos e Michel foram afastados depois de terem sido flagrados na concentração do Olímpico com bebida alcoólica. Em novembro, foi a vez de Fábio Bilica ser demitido depois de discutir com o técnico Cláudio Duarte durante um treino. O zagueiro foi pivô de outra crise. Duas semanas antes de ser dispensado, faltou a um treino. Publicamente, a explicação oficial era a de que ele estava gripado. Na verdade, havia perdido o horário por causa de uma festa na noite anterior. No rescaldo da orgia romana do Trovão Azul (hoje mais conhecido como "Transuruba"), na volta de Curitiba, o volante Cocito, que havia chegado trêbado em Porto Alegre, resolveu se esconder atrás de uma mochila para que os fotógrafos não flagrassem a sua ressaca, acabou envolvendo-se em um incidente na chegada ao estádio. Irritado, o jogador foi tirar satisfação com um fotógrafo e só não partiu para a agressão física porque foi contido pelos seguranças. Mais tarde, tentou explicar a situação. “Eu estava todo descabelado, com a cara inchada (sic) da viagem de volta para Porto Alegre. Nunca fui de fugir de entrevista. Agora podem tirar a foto”, disse ele, despistando o bundalelê da madrugada. Öbvio: a despeito do estado do seu cabelo, o bafo de bira não ia enganar os setoristas. se a imprensa contass tudo o que esses moços fizeram, certamente que teriam que jogar em outro planeta...
Jogadores baratos? A rapa da rapa? Quem é o algoz dessa degradação? Em fevereiro, após a transferência de Ronaldinho do PSG para o Barcelona, o Grêmio recebeu R$ 5 milhões do clube catalão. O valor referia-se à parte que a Fifa obriga a pagar ao clube formador do atleta (5% do total da transação). Deste dinheiro, R$ 1,5 milhão foi para o pagamento de uma dívida com o Banco Santander. O restante acabou direcionado para gastos que não envolveram contratações.
Ter a amortização da dívida de R$ 95 milhões como prioridade foi o que norteou a malfadada gestão Flávio Obino em 2003/2004. Para isso ser possível, o futebol terminou relegado, principalmente no segundo ano de gestão, quando estrelas do porte de Gilberto e Anderson Lima, que disputaram a Libertadores na temporada anterior, deixaram o Olímpico. Como conseqüência, ficou difícil apoiar Obino em 2004. Os fracassos dentro de campo e a penúria financeira espantaram todos os ex-presidentes que o colocaram no cargo no ano anterior. Obteve ajuda, mesmo, apenas de Hélio Dourado - curiosamente, o único membro do Conselho Consultivo que deu voto contrário à sua aclamação -, que assumiu a vice-presidência de futebol em junho. A ausência de respaldo dos ex-dirigentes foi a maior mágoa do quixotesco Obino. Maior até do que a queda para a Série B.