Demorei bem mais do que gostaria para escrever minhas impressões iniciais do jogo. Primeiramente, queria aproveitar bem mais do que o primeiro capítulo, que basicamente é um tutorial. Depois, fui sugado pelo faroeste. Toda vez que pensava em pausar a jogatina para escrever, não conseguia.
Red Dead Redemption 2 não é um jogo fácil. Pessoas que já jogaram outros produtos da R* sabem o que esperar: personagem pesado, movimentação que favorece loop de animação e não instantaneidade de comando, gunplay aquém dos shooters de ponta do mercado, e assim vai. Se pensarmos que, em 2018, Arthur Morgan se movimenta de maneira semelhante a jogos de 5, 10 anos atrás, e que esses já não eram referências positivas quando foram lançados, temos um problema. A Naughty Dog, por exemplo, também produziu um gunplay medíocre nos primeiros três jogos da série Uncharted, e favorecia o realismo das animações em detrimento do gameplay, porém Nathan era leve, e o equilíbrio na equação de toda sua movimentação deixava-a bem mais prazerosa do que nos jogos da R*. Ou seja: tem como entregar algo bem melhor em termos de jogabilidade, ainda mantendo a proposta realista, e a Rockstar insiste em errar.
Ultrapassando a barreira da movimentação e demais ações, temos a mundanidade do faroeste. O jogo não é repleto de ação desenfreada, explosões, monstros épicos, reinos a serem salvos, tampouco é um sandbox com opções elaboradas para trazer o caos ao mundo. Entretanto, isso não é negativo. Na verdade, a maior força de RDR2 é justamente o realismo com que apresenta a vida de um fora-da-lei dos filmes de Spaghetti Western. Longas cavalgadas, natureza, perversidade humana em narrativas pessimistas, a busca pela riqueza, por propósito em um país que se transformava radicalmente de ano para ano, e a constante luta para simplesmente sobreviver mais um dia.
RDR2 não foi feito para ser jogado como a maioria dos demais open worlds, e o comprometimento da desenvolvedora em mergulhar de ponta cabeça na proposta que destacou-o dos demais. Assetto Corsa não foi feito para ser jogado como um Need for Speed é jogado. Assetto Corsa apresenta um ritmo diferente; extrai entretenimento de maneira diferente. É um dos melhores jogos de direção da história - e provavelmente foi muito xingado por jogadores não acostumados com a proposta, ou que simplesmente não procuravam aquilo. Isso não faz de Assetto um jogo ruim, tampouco faz com que o jogador seja menos “gamer”. Só não existiu compatibilidade.
Creio que o mesmo acontecerá bastante com RDR2. Em locais fechados, você só pode andar. Cada ação possui um loop de animação detalhado. Para extrair o melhor de Arthur, precisamos comer, dormir. Mecânicas tradicionais como fast travel e summonar o cavalo estão “escondidas” e ainda assim exigem uma quantidade de recursos consideráveis para as primeiras horas do jogo. Em certas horas, parece que “nada acontece”.
Mas tudo acontece. O mundano universo de RDR2 é muito mais vivo do que qualquer outro open world que já joguei. A recriação da bela natureza de nosso planeta, junto da primazia técnica do jogo, é de emocionar em certos momentos. Os animais seguem lógica de caça e predador, e são fantasticamente bem animados. OS NPCs discutem, transam, brigam, roubam, sentem ciúmes, cheiros, medo e vivem narrativas próprias independente da presença de Arthur. Existe uma minúcia em detalhes tão absurda que só poderia ser atingida com o trabalho escravo de mais de 2 mil pessoas, mesmo.
Pode-se fumar no jogo, o que aumentará de maneira irrisória a recuperação do Dead Eye. Pode-se acordar, falar bom dia para os colegas do acampamento, pegar uma caneca de café e sentar de frente para a fogueira enquanto contam-se histórias do passado. Pode-se dar bom dia para absolutamente todas as pessoas do jogo. Pode-se tirar fotos, observar o comportamento dos animais, ter a barba mais imponente do velho-oeste, passar semanas ao relento sem banho. E nada disso afetará drasticamente os demais sistemas ou histórias do jogo. Mas você pode, e esse é o importante. RDR2 te apresenta um mundo que reconhece o jogador como absolutamente nenhum outro jogo reconheceu, mas que também funciona independente de nós.
Como eu disse: é um jogo complicado. A R* optou por quase não segurar na mão do jogador, e não indicar para nós o que fazer nem como fazer. Ela confiou que conseguiríamos achar a maneira mais aprazível de jogar. Eu garanto que, se sentarmos em rodas e começarmos a falar de nossas experiências, cada um terá descoberto algo novo, visto algo novo, vivido toda uma aventura que independe de qualquer missão do jogo. É orgânico. É vivo.
De resto, preciso nem falar sobre gráficos, roteiro, design de som, etc. Está tudo impecável, e com uma performance surpreendentemente estável no PS4.
Até agora, é meu jogo da geração junto com Witcher 3 e BotW. Incrível como que o gênero de mundo aberto cresceu nessa geração e ganhou novos ares.