"Eu e minha esposa (Edilene) sempre procuramos dar a melhor educação. Ele sempre foi correto desde criança. Não queria ter um filho trapaceiro, mal educado, que fosse tirar vantagem em cima de ninguém.
"Não foi um lance que prejudicou o time em nada, não modificou o placar, o jogo. Da mesma forma teria perdido. Não vai fazer diferença se o Jô joga ou não na próxima partida, pois não sabia que estava pendurado. Se ele marcar novamente vai ser mérito dele. Não tem nada a ver.
"Foi feito com a consciência tranquila e foi corretíssima a atitude dele. Me deixou muito orgulhoso, mostra que tem personalidade e fala a verdade. Tinha que ser assim mesmo. A verdade sempre tem que ser dita. Essa honestidade vai valer para a vida toda."
Estas foram as palavras de Celso Russo, pai de Rodrigo Caio, à Band.
E colocam de maneira clara, transparente, o incômodo que provocou à família do zagueiro do São Paulo. Toda polêmica que ganhou o país em relação a um lance que deveria ser banal. Em uma dividida entre ele, Jô e Renan Ribeiro, o goleiro foi atingido no joelho. O juiz Luiz Flávio de Oliveira errou, acreditou que havia sido Jô quem acertou Renan Ribeiro e deu o cartão amarelo. Jô ficaria suspenso e não enfrentaria o São Paulo no próximo domingo. Seria um desfalque importantíssimo para o Corinthians.
Só que Rodrigo Caio fez questão de chamar o árbitro e falar que foi ele quem acertou o corintiano. Luiz Flávio anulou o cartão.
Justiça foi feita.
Vida que deveria seguir.
Mas não importa a reação de apoio quase incondicional dos jornalistas, do técnico Tite, do presidente da Comissão da Arbitragem da CBF, dos jogadores de uma maneira geral, de grande parte da população. E até do presidente da Conmebol, Alejandro Domínguez.
"O fairplay não é clássico (comum), ainda mais num clássico. Para mostrar àqueles que ainda não são profissionais. Obrigado, Rodrigo Caio", postou no twitter.
Não.
O que segue pesando para Rodrigo Caio foi a reação de Rogério Ceni e da maioria dos seus companheiros. O treinador do São Paulo deixou claro no intervalo que não gostou da atitude. Perguntou ao zagueiro se ele sabia que Jô estava 'pendurado'. O técnico sabia que o zagueiro tinha esta certeza. Porque já virou hábito há muito tempo no Morumbi, o time saber os adversários com dois amarelos.
Não bastasse isso, Rogério Ceni ainda perguntou se Rodrigo Caio acreditava que se fosse ao contrário, qualquer corintiano iria se entregar e evitar que ele fosse suspenso. Desperdiçaria a chance de tirá-lo de uma semifinal de campeonato.
O zagueiro não quis polêmica.
Ouviu calado.
Mas veio a derrota, que não foi culpa da atitude de Rodrigo Caio. Mas da incompetência de Rogério Ceni em superar o sistema defensivo de Fabio Carille e ainda expor o time a contragolpes. O São Paulo perdeu no Morumbi, diante de seus 45.366 torcedores.
A equipe já havia sido derrotada no mesmo cenário para o Cruzeiro, pelos mesmos 2 a 0, no Morumbi.
Mas a honestidade de Rodrigo Caio foi algo que não só chamou a atenção. Serviu como desculpa ideal para Ceni desviar o foco da péssima maneira que montou o time. E ironizou na sua entrevista coletiva após o jogo.
"O Rodrigo Caio foi um gentleman, é uma atitude que vocês (jornalistas) têm que parabenizar porque ele é um menino bom. Jogou o jogo do fair play, assim como todos fazem durante uma partida."
Ironia pura, porque o treinador sabe que, no ambiente do futebol, o comum é a mentira, o levar vantagem em tudo.
Maicon sabe muito bem disso. Ele deixou de ser capitão e saiu do Porto acusado de uma simulação absurda. Ele tentou driblar um atacante do Arouca. Perdeu a bola e fez seu time perder a partida por 2 a 1. Em seguida, de acordo com a imprensa portuguesa, ao perder a bola decisiva, simulou uma contusão para justificar o erro. A diretoria tirou sua faixa de capitão e o negociou com o São Paulo. Maicon teve uma ótima passagem pelo Porto, mas ficou marcado pela simulação para se defender da inacreditável falha.
"Eu acho que é melhor a mãe deles (corintianos) chorando do que a minha. Prefiro a mãe dos meus adversários chorando do que a minha", disse Maicon, não aceitando a postura honesta do companheiro. Jucilei também foi na mesma direção, lembrou que Jô simulou pênalti contra o São Bento.
Rodrigo Caio está se sentindo muito mal no clube.
Não quer ser visto como ingênuo e muito menos como alienado.
Nem como herói.
Digno de prêmios, de cartão verde.
A família do jogador está revoltada.
Assim como seus amigos.
Ninguém aceita a postura de Ceni e dos jogadores do São Paulo.
O jogador de 23 anos acabou de renovar contrato com o clube até 2021.
Chegou ao merecido teto de R$ 400 mil mensais.
E o clube aumentou sua multa rescisória para cerca de R$ 90 milhões.
Cerca de R$ 84 milhões, 25 milhões de euros.
Fazia parte dos planos do reeleito Leco vender o zagueiro.
Aproveitar a janela do meio do ano.
Mas Rogério Ceni, como fez no início de 2017, já pediu que o segure.
Prefere a saída de Maicon.
A princípio, Rodrigo Caio ficaria.
Estava se sentindo muito valorizado desde março.
Ganhar o teto era tudo o que queria.
Até domingo.
Ele está desiludido pela maneira que está sendo tratado.
Chateado com seus familiares e amigos tristes.
E se sentindo completamente injustiçado.
Nunca acreditou que ser honesto o atrapalharia a vida.
Sabe que a situação poderá ficar muito pior no domingo.
Caso o Corinthians elimine o São Paulo da final do Paulista, no Itaquerão.
Ainda mais com boa atuação e gols de Jô.
A pressão já começa hoje, em Belo Horizonte, contra o Cruzeiro.
A atuação de Rodrigo Caio será observada de maneira diferenciada.
Já uma velada pressão contra ele.
Suas eventuais falhas serão destacadas.
Tenso, Rodrigo Caio se recusou a dar entrevistas.
Sua única frase sobre o caso foi logo após a derrota de domingo.
"Não fiz nada demais, fiz só o que deveria fazer."
Ele só se esqueceu que vive no Brasil.
O país que vê os corruptos como espertos.
E os honestos como ingênuos, bobos, trouxas.
Pensou que seria diferente no Morumbi.
Poderia mostrar sua índole, sua educação que aprendeu com o pai.
Mas não se desiludiu.
Com Ceni, com os companheiros, com a torcida.
A Europa ficou mais perto para Rodrigo Caio.
Afinal, seu lugar não é mesmo na terra da corrupção...