Sora O alquimista de fogo
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Mario Bunge é um físico e filósofo hispano-americano. Nomeia-se cientificista e comprometido com os valores do secularismo republicano, socialismo democrático e direitos humanos. Inimigo ferraz das pseudociências, principalmente, Darwinismo social, Existencialismo, Psicanálise e Escola Austríaca. Tem várias entrevistas e matérias do autor no Universo Racionalista. Organizei a mais importante com trechos do livro dele "Economia y Filosofia". Tirem suas conclusões.
Economía y Filosofía - Mario Bunge
Até meados da década de 1960, quem quisesse se envolver com misticismo, com embuste intelectual ou com anti intelectualismo, teria de fazê-lo fora dos bosques sagrados da academia; por quase dois séculos antes do tempo em que a universidade era uma instituição de ensino superior, onde as pessoas cultivavam o intelecto, envolvidas em uma discussão racional, procuravam a verdade, aplicavam-na, ou a ensinavam para a melhor de suas habilidades. Para ter a certeza de que de vez em quando um traidor de um destes valores era descoberto, ele era prontamente condenado ao ostracismo.
Os inimigos acadêmicos da própria raison d’être da universidade podem ser agrupados em duas classes: os anticientistas, que muitas vezes se intitulam “pós-modernistas”, e os pseudocientistas. A pseudociência é sempre perigosa porque contamina a cultura e quando o que está em jogo é a saúde, a economia ou a organização política, a falsa ciência coloca a vida, a liberdade e a paz em risco. Mas, desde já, a pseudociência se torna extremamente perigosa quando goza do apoio de governos, religiões organizadas ou as grandes empresas.
Na passarela lotada de pseudociências, há estrelas que se destacam. E não é fácil acompanhar as que mais lucram. Segundo Mario Bunger “Depende do país. Na Argentina, todas prosperam igualmente. No México, xamanismo de ervas. E nos Estados Unidos, teoria econômica de livre-mercado”.
Legisladores norte-americanos recorreram à eugenia, fomentada em uma época por muitos cientistas e intelectuais públicos de boa fé, para propor e aprovar leis que limitam a imigração de pessoas de “raças inferiores” e levou à internação de milhares de crianças consideradas débeis mentais. Essa mesma “ciência” justificava as políticas raciais das potências coloniais e dos nazistas, e levou à escravidão e assassinato de milhões de nativos americanos, índios, negros, eslavos, judeus e ciganos.
A crise global que começou em 2008 é um exemplo atual das consequências sociais catastróficas decorrentes de políticas sociais baseadas em filosofias econômicas e políticas equivocadas. Na verdade, há consenso de que as culpadas por esta crise são as políticas de laissez faire(livre mercado) aplicadas pelos governos americano e britânico desde os tempos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher. Agora, laissez faire não é um slogan ideológico isolado: é a consequência lógica de dois dogmas que permanecem acriticamente, apesar das mudanças na realidade econômica desde que Adam Smith (1776) publicou sua grande obra. Esses dogmas são os princípios que a) o único propósito da atividade econômica é o lucro privado; e b) o mercado livre (não regulado) regula a si mesmo, ou seja, está sempre em equilíbrio ou perto dele, e certamente, qualquer intervenção terá um efeito negativo sobre ele.
Por sua vez, a hipótese acima é baseada em três doutrinas filosóficas aceitas sem exame: uma ontologia individualista, uma epistemologia não científica e uma ética individualista. O individualismo é a tese de que só existem indivíduos: que as entidades coletivas, como empresas e nações, são produtos da imaginação. Esta tese é errada: o que é fictício é o indivíduo isolado. As ações individuais só podem ser compreendidas no seu contexto social. Pode-se iniciar a análise em nível micro ou macro, mas nenhuma análise é satisfatória negligenciando-se um dos dois extremos. A lição metodológica é que qualquer explicação satisfatória de um evento social irá incluir o que eu chamo de diagramas Boudon-Coleman (Bunge, 1996). Aqui está um exemplo recente:
Macronível: crédito fácil, bolha imobiliária, crise.
Micronível: aumento por demanda de moradia, descumprimento.
Os diagramas Boudon-Coleman vão contra a metodologia individualista radical, que incentiva a permanecer sempre no nível micro. Assim como o holismo é acompanhado por uma ética do dever, como com Confúcio e Kant, o individualismo é atrelado ao slogan egoísta “cada um por si”. O sistemismo, no entanto, propõe uma ética humanista em que os direitos e deveres são igualmente importantes. Nessa filosofia moral, todo direito implica um dever e vice-versa. Por exemplo, o meu direito de ganhar a vida implica o dever de ajudar os outros a sobreviver, e meu dever de pagar impostos representa o meu direito de participar na decisão de como esse dinheiro será gasto. Defendo que as pessoas comuns são regidas por uma filosofia moral como esta, enquanto os políticos e economistas conservadores pregam a deontologia às massas, ao mesmo tempo que aconselham o egoísmo a seus clientes.
O economista ortodoxo objetará a inclusão da política e da moralidade entre os determinantes da política econômica: dirá que se trata de regras puramente técnicas relativas ao manual de instruções do maquinário macroeconômico. Esta afirmação, no entanto, está incorreta no melhor dos casos, ou é fingida no pior deles, já que não há dúvida de que toda a política econômica vai avançar certos interesses enquanto prejudicará outros. Por exemplo, o livre comércio favorece aos fortes ao mesmo tempo que freia o desenvolvimento dos fracos; e o estado de bem-estar melhora a sorte dos pobres taxando os ricos. Em suma, qualquer política pública é moralmente comprometida. Isto foi compreendido pelo grande socioeconomista Gunnar Myrdal quando, algum tempo atrás, nós exortou: Declare seus valores! Se não o fizermos, poderemos estar ajudando a justificar a pseudociência ou a ciência mercenária.
O monetarismo de Friedman é a política econômica liberal segundo a qual tudo o que precisa ser feito para manter a saúde da economia é controlar a oferta de dinheiro. Isto é, a impressão de notas do banco e crédito bancário (Friedman 1963, 1968, 1980). Inevitavelmente, o monetarismo lembra outras panacéias: água com alcatrão, manipulação da coluna vertebral e a sangria, especialmente o último. Recorre-se primeiro a bruxaria, quando outros remédios parecem falhar; e como a bruxaria, é adotada pela fé, e não pela base de uma teoria comprovada e estatística.
Governos conservadores, e até mesmo alguns governos liberais, adotam o monetarismo por dois motivos: por causa de sua simplicidade e porque acontece de favorecer os ricos.
Mas a contribuição mais importante do professor Friedman a fundamentação teórica da política monetarista é o seu quadro teórico para análise monetária (1970). Ele está certo em chamá-lo de "arcabouço teórico", e seria ainda mais correto chamá-lo "programa de uma teoria" ou "pagaré teórico", porque não é uma teoria adequada.
Este sistema conceitual contém três símbolos funcionais totalmente indeterminados (f g e l), de modo que as fórmulas em que aparecem são declarações vagas do tipo l/ é alguma função/ de X. Toda a política econômica que recomenda Friedman é, portanto, baseado em um programa para uma teoria, não em uma teoria explicitamente formulada e testada empiricamente. Sendo um programa (que alguém deveria executar) é incapaz de explicar ou predizer qualquer coisa.
Não diremos mais nada sobre a base teórica e empírica miserável do monetarismo. Mas sobre a relação as filosofias morais, sociais e políticas que a baseiam, que são essencialmente as do liberalismo econômico, isto é, individualismo. (Veja Hayek (1949) para uma formulação lúcida do individualismo.)
Esta doutrina se resume aos seguintes princípios:
a)egoísmo (Cada um por si)
b)darwinismo social ("Somente os mais bem adaptados sobrevivem e merecem sobreviver à competição econômica")
c)liberalismo político (distintamente diferente da democracia).
Na minha opinião o primeiro não é apenas desprezível, mas também ineficaz (exceto em rasgar o tecido da sociedade), uma vez que a vida em sociedade requer um mínimo de altruísmo e cooperação. Também assumiremos que o darwinismo social já há muito refutado, se apenas porque: (a) na vida real falham muitas empresas sólidas e muitas aventureiras selvagens tem sucesso, e (b) a "disciplina severa do mercado" molda não apenas os líderes, mas também os golpistas e opressores.
Quanto à associação entre liberdade econômica e política, parece que é apenas um correlação temporária tomada por relação causal permanente. Na verdade, embora o laissez faire econômico tenha sido vinculado às liberdades políticas em quatro nações (Holanda, Grã-Bretanha, França e EUA) entre 1750 e 1850. Esta associação não vale a pena em lugar nenhum, não apenas porque os monopólios e a intervenção estatal mataram a livre iniciativa. Mais ainda assim, a manutenção bem-sucedida da livre iniciativa irrestrito exigiria um governo autoritário pronto para suprimir quaisquer ameaças à liberdade econômica, como as representadas pelo movimento dos trabalhadores, partidos políticos que defendem a nacionalização dos serviços públicos e dos recursos energéticos, e até o movimento cooperativo. Como diz Prebisch (l98l), "os princípios neoliberais só podem ser aplicado sob um regime de força ".
Os austríacos não tem uma teoria sobre a inflação, nem, por consequência, argumentos para justificar suas recomendações para resolver o problema da inflação. Porém, desde já possuem uma Hipótese sobre a origem da inflação, e uma regra baseada nesta hipótese. A hipótese é que a inflação é causada pela impressão de dinheiro; a regra é parar as prensas de impressão de notas. A hipótese é demasiada simples para ser verdadeira. Em todo o caso, verifica-se o contrário, a saber, que a velocidade com que um governo imprime dinheiro é determinada pela diferença entre as despesas e as receitas do Estado. Se o primeiro excede o segundo, o Governo imprime dinheiro ou o toma emprestado para cumprir suas obrigações; apenas um orçamento estritamente equilibrado resulta em velocidade zero de oferta de moeda.
Em resumo, teorias e modelos econômicos eles devem ser testados da mesma forma que quaisquer outros modelos e teorias da ciência. Na verdade, as teorias econômicas mais conhecidas presumem ou contêm hipóteses que não podem ser testadas por meios objetivos, como os relativos ao valor e à utilidade. Além disso, a teoria assinatura neoliberal contém um postulado central que foi refutada por pesquisas empíricas, ou seja, a hipótese de que os empresários sempre visam maximizar os lucros (em vez de buscar crescimento, ou satisfação, ou mera sobrevivência). Também contém outros postulados que, embora possam ter sido válidos para o mercado livre, deixaram de ser válidos porque o mercado livre não existe mais.
Resumindo: o mercado livre, objeto das teorias liberais e neoliberais, não existe mais, portanto, essas teorias são apenas de interesse histórico. Quanto à tentativa de reviver o mercado livre, com somente eliminar as regulações governamentais, ao estilo das adotadas por governos da Gran Bretânia e EE. UU. da Norteamérica, estão condenadas a fracassar. Primeiro, porque estas medidas não tocam a grandes corporações, as que - como Adam Smith e Karl Marx notaram - reduzem substancialmente a própria essência da economia livre, a saber, a competição. Em segundo lugar, porque esses regulamentos, odiados pelos mercadores da liberdade econômica, são a única proteção para os pequenos capitalistas e o público. Portanto, a eliminação do estado de bem-estar social (welfare state) em nome da teoria neoliberal (economia do bem-estar) causará não apenas miséria, mas também descontentamento e, eventualmente, rebelião. A ganância é um mau conselheiro.
Afim. Há dois tipos de ignorância: Natural ou direta, e artificial ou intencional. Nenhum departamento de química contrataria um alquimista. Um departamento de cristalografia não é lugar para crentes no poder psíquico de cristais. Nenhuma escola de engenharia iria manter a intenção de alguém em projetar uma máquina de movimento perpétuo. Nenhuma psicologia junguiana é ensinada em qualquer departamento de auto-respeito da psicologia. Quem crê em Economia de livre mercado não pode fazê-la em uma escola de economia credenciada. Para generalizar: nem falsidades ou mentiras comprovadas são ensinadas em qualquer instituição científica ou tecnológica. E por uma razão muito boa também: a saber, porque tais instituições são criadas com o propósito específico de encontrar, refinar, aplicar, ou ensinar verdades, e não apenas velhas opiniões.
Fontes:
Economía y Filosofía - Mario Bunge
Até meados da década de 1960, quem quisesse se envolver com misticismo, com embuste intelectual ou com anti intelectualismo, teria de fazê-lo fora dos bosques sagrados da academia; por quase dois séculos antes do tempo em que a universidade era uma instituição de ensino superior, onde as pessoas cultivavam o intelecto, envolvidas em uma discussão racional, procuravam a verdade, aplicavam-na, ou a ensinavam para a melhor de suas habilidades. Para ter a certeza de que de vez em quando um traidor de um destes valores era descoberto, ele era prontamente condenado ao ostracismo.
Os inimigos acadêmicos da própria raison d’être da universidade podem ser agrupados em duas classes: os anticientistas, que muitas vezes se intitulam “pós-modernistas”, e os pseudocientistas. A pseudociência é sempre perigosa porque contamina a cultura e quando o que está em jogo é a saúde, a economia ou a organização política, a falsa ciência coloca a vida, a liberdade e a paz em risco. Mas, desde já, a pseudociência se torna extremamente perigosa quando goza do apoio de governos, religiões organizadas ou as grandes empresas.
Na passarela lotada de pseudociências, há estrelas que se destacam. E não é fácil acompanhar as que mais lucram. Segundo Mario Bunger “Depende do país. Na Argentina, todas prosperam igualmente. No México, xamanismo de ervas. E nos Estados Unidos, teoria econômica de livre-mercado”.
Legisladores norte-americanos recorreram à eugenia, fomentada em uma época por muitos cientistas e intelectuais públicos de boa fé, para propor e aprovar leis que limitam a imigração de pessoas de “raças inferiores” e levou à internação de milhares de crianças consideradas débeis mentais. Essa mesma “ciência” justificava as políticas raciais das potências coloniais e dos nazistas, e levou à escravidão e assassinato de milhões de nativos americanos, índios, negros, eslavos, judeus e ciganos.
A crise global que começou em 2008 é um exemplo atual das consequências sociais catastróficas decorrentes de políticas sociais baseadas em filosofias econômicas e políticas equivocadas. Na verdade, há consenso de que as culpadas por esta crise são as políticas de laissez faire(livre mercado) aplicadas pelos governos americano e britânico desde os tempos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher. Agora, laissez faire não é um slogan ideológico isolado: é a consequência lógica de dois dogmas que permanecem acriticamente, apesar das mudanças na realidade econômica desde que Adam Smith (1776) publicou sua grande obra. Esses dogmas são os princípios que a) o único propósito da atividade econômica é o lucro privado; e b) o mercado livre (não regulado) regula a si mesmo, ou seja, está sempre em equilíbrio ou perto dele, e certamente, qualquer intervenção terá um efeito negativo sobre ele.
Por sua vez, a hipótese acima é baseada em três doutrinas filosóficas aceitas sem exame: uma ontologia individualista, uma epistemologia não científica e uma ética individualista. O individualismo é a tese de que só existem indivíduos: que as entidades coletivas, como empresas e nações, são produtos da imaginação. Esta tese é errada: o que é fictício é o indivíduo isolado. As ações individuais só podem ser compreendidas no seu contexto social. Pode-se iniciar a análise em nível micro ou macro, mas nenhuma análise é satisfatória negligenciando-se um dos dois extremos. A lição metodológica é que qualquer explicação satisfatória de um evento social irá incluir o que eu chamo de diagramas Boudon-Coleman (Bunge, 1996). Aqui está um exemplo recente:
Macronível: crédito fácil, bolha imobiliária, crise.
Micronível: aumento por demanda de moradia, descumprimento.
Os diagramas Boudon-Coleman vão contra a metodologia individualista radical, que incentiva a permanecer sempre no nível micro. Assim como o holismo é acompanhado por uma ética do dever, como com Confúcio e Kant, o individualismo é atrelado ao slogan egoísta “cada um por si”. O sistemismo, no entanto, propõe uma ética humanista em que os direitos e deveres são igualmente importantes. Nessa filosofia moral, todo direito implica um dever e vice-versa. Por exemplo, o meu direito de ganhar a vida implica o dever de ajudar os outros a sobreviver, e meu dever de pagar impostos representa o meu direito de participar na decisão de como esse dinheiro será gasto. Defendo que as pessoas comuns são regidas por uma filosofia moral como esta, enquanto os políticos e economistas conservadores pregam a deontologia às massas, ao mesmo tempo que aconselham o egoísmo a seus clientes.
O economista ortodoxo objetará a inclusão da política e da moralidade entre os determinantes da política econômica: dirá que se trata de regras puramente técnicas relativas ao manual de instruções do maquinário macroeconômico. Esta afirmação, no entanto, está incorreta no melhor dos casos, ou é fingida no pior deles, já que não há dúvida de que toda a política econômica vai avançar certos interesses enquanto prejudicará outros. Por exemplo, o livre comércio favorece aos fortes ao mesmo tempo que freia o desenvolvimento dos fracos; e o estado de bem-estar melhora a sorte dos pobres taxando os ricos. Em suma, qualquer política pública é moralmente comprometida. Isto foi compreendido pelo grande socioeconomista Gunnar Myrdal quando, algum tempo atrás, nós exortou: Declare seus valores! Se não o fizermos, poderemos estar ajudando a justificar a pseudociência ou a ciência mercenária.
O monetarismo de Friedman é a política econômica liberal segundo a qual tudo o que precisa ser feito para manter a saúde da economia é controlar a oferta de dinheiro. Isto é, a impressão de notas do banco e crédito bancário (Friedman 1963, 1968, 1980). Inevitavelmente, o monetarismo lembra outras panacéias: água com alcatrão, manipulação da coluna vertebral e a sangria, especialmente o último. Recorre-se primeiro a bruxaria, quando outros remédios parecem falhar; e como a bruxaria, é adotada pela fé, e não pela base de uma teoria comprovada e estatística.
Governos conservadores, e até mesmo alguns governos liberais, adotam o monetarismo por dois motivos: por causa de sua simplicidade e porque acontece de favorecer os ricos.
Mas a contribuição mais importante do professor Friedman a fundamentação teórica da política monetarista é o seu quadro teórico para análise monetária (1970). Ele está certo em chamá-lo de "arcabouço teórico", e seria ainda mais correto chamá-lo "programa de uma teoria" ou "pagaré teórico", porque não é uma teoria adequada.
Este sistema conceitual contém três símbolos funcionais totalmente indeterminados (f g e l), de modo que as fórmulas em que aparecem são declarações vagas do tipo l/ é alguma função/ de X. Toda a política econômica que recomenda Friedman é, portanto, baseado em um programa para uma teoria, não em uma teoria explicitamente formulada e testada empiricamente. Sendo um programa (que alguém deveria executar) é incapaz de explicar ou predizer qualquer coisa.
Não diremos mais nada sobre a base teórica e empírica miserável do monetarismo. Mas sobre a relação as filosofias morais, sociais e políticas que a baseiam, que são essencialmente as do liberalismo econômico, isto é, individualismo. (Veja Hayek (1949) para uma formulação lúcida do individualismo.)
Esta doutrina se resume aos seguintes princípios:
a)egoísmo (Cada um por si)
b)darwinismo social ("Somente os mais bem adaptados sobrevivem e merecem sobreviver à competição econômica")
c)liberalismo político (distintamente diferente da democracia).
Na minha opinião o primeiro não é apenas desprezível, mas também ineficaz (exceto em rasgar o tecido da sociedade), uma vez que a vida em sociedade requer um mínimo de altruísmo e cooperação. Também assumiremos que o darwinismo social já há muito refutado, se apenas porque: (a) na vida real falham muitas empresas sólidas e muitas aventureiras selvagens tem sucesso, e (b) a "disciplina severa do mercado" molda não apenas os líderes, mas também os golpistas e opressores.
Quanto à associação entre liberdade econômica e política, parece que é apenas um correlação temporária tomada por relação causal permanente. Na verdade, embora o laissez faire econômico tenha sido vinculado às liberdades políticas em quatro nações (Holanda, Grã-Bretanha, França e EUA) entre 1750 e 1850. Esta associação não vale a pena em lugar nenhum, não apenas porque os monopólios e a intervenção estatal mataram a livre iniciativa. Mais ainda assim, a manutenção bem-sucedida da livre iniciativa irrestrito exigiria um governo autoritário pronto para suprimir quaisquer ameaças à liberdade econômica, como as representadas pelo movimento dos trabalhadores, partidos políticos que defendem a nacionalização dos serviços públicos e dos recursos energéticos, e até o movimento cooperativo. Como diz Prebisch (l98l), "os princípios neoliberais só podem ser aplicado sob um regime de força ".
Os austríacos não tem uma teoria sobre a inflação, nem, por consequência, argumentos para justificar suas recomendações para resolver o problema da inflação. Porém, desde já possuem uma Hipótese sobre a origem da inflação, e uma regra baseada nesta hipótese. A hipótese é que a inflação é causada pela impressão de dinheiro; a regra é parar as prensas de impressão de notas. A hipótese é demasiada simples para ser verdadeira. Em todo o caso, verifica-se o contrário, a saber, que a velocidade com que um governo imprime dinheiro é determinada pela diferença entre as despesas e as receitas do Estado. Se o primeiro excede o segundo, o Governo imprime dinheiro ou o toma emprestado para cumprir suas obrigações; apenas um orçamento estritamente equilibrado resulta em velocidade zero de oferta de moeda.
Em resumo, teorias e modelos econômicos eles devem ser testados da mesma forma que quaisquer outros modelos e teorias da ciência. Na verdade, as teorias econômicas mais conhecidas presumem ou contêm hipóteses que não podem ser testadas por meios objetivos, como os relativos ao valor e à utilidade. Além disso, a teoria assinatura neoliberal contém um postulado central que foi refutada por pesquisas empíricas, ou seja, a hipótese de que os empresários sempre visam maximizar os lucros (em vez de buscar crescimento, ou satisfação, ou mera sobrevivência). Também contém outros postulados que, embora possam ter sido válidos para o mercado livre, deixaram de ser válidos porque o mercado livre não existe mais.
Resumindo: o mercado livre, objeto das teorias liberais e neoliberais, não existe mais, portanto, essas teorias são apenas de interesse histórico. Quanto à tentativa de reviver o mercado livre, com somente eliminar as regulações governamentais, ao estilo das adotadas por governos da Gran Bretânia e EE. UU. da Norteamérica, estão condenadas a fracassar. Primeiro, porque estas medidas não tocam a grandes corporações, as que - como Adam Smith e Karl Marx notaram - reduzem substancialmente a própria essência da economia livre, a saber, a competição. Em segundo lugar, porque esses regulamentos, odiados pelos mercadores da liberdade econômica, são a única proteção para os pequenos capitalistas e o público. Portanto, a eliminação do estado de bem-estar social (welfare state) em nome da teoria neoliberal (economia do bem-estar) causará não apenas miséria, mas também descontentamento e, eventualmente, rebelião. A ganância é um mau conselheiro.
Afim. Há dois tipos de ignorância: Natural ou direta, e artificial ou intencional. Nenhum departamento de química contrataria um alquimista. Um departamento de cristalografia não é lugar para crentes no poder psíquico de cristais. Nenhuma escola de engenharia iria manter a intenção de alguém em projetar uma máquina de movimento perpétuo. Nenhuma psicologia junguiana é ensinada em qualquer departamento de auto-respeito da psicologia. Quem crê em Economia de livre mercado não pode fazê-la em uma escola de economia credenciada. Para generalizar: nem falsidades ou mentiras comprovadas são ensinadas em qualquer instituição científica ou tecnológica. E por uma razão muito boa também: a saber, porque tais instituições são criadas com o propósito específico de encontrar, refinar, aplicar, ou ensinar verdades, e não apenas velhas opiniões.
Fontes:
A relação entre pseudociência e política
A pseudociência é sempre perigosa porque contamina a cultura e quando o que está em jogo é a saúde, a economia ou a organização política, a falsa ciência coloca a vida, a liberdade e a paz em risco. Mas, desde já, a pseudociência se torna extremamente perigosa quando goza do apoio de governos...
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