Ta aí o texto completo traduzido. Desculpem a demora.
Eu ainda não revisei, então ainda deve ter uns erros. Eu vou ler novamente e editar o post pra corrigir o que eu encontrar de errado.
Como o nunca lançado Resident Evil 1.5 sobreviveu 22 anos para aparecer em Resident Evil 2 Remake.
Em 1996, Capcom encaixotou a sequência praticamente completa de Resident Evil e começou de novo. Isto é o que aconteceu com aquele jogo.
Guardada na vindoura edição Digital Deluxe de Resident Evil 2 Remake está a roupa “Elza Walker” para Claire Redfield. Elza é uma personagem que nunca apareceu de fato na série; é uma referência à primeira tentativa, não lançada, de fazer uma sequência – uma versão de Resident Evil 2 que estava, segundo o então diretor Hideki Kamiya, 70% completa quando foi cancelada em 1997.
Agora conhecido como Resident Evil 1.5, o que faz essa sequência abortada tão interessante é que a Capcom continuou a usar versões dela para demonstrar e promover o jogo por cerca de um ano. Como Hideki Kamiya explicou uma vez antes, “Resident Evil 2 estava recebendo atenção como um dos novos grandes títulos da Capcom”, e o estúdio queria manter a excitação alta após o sucesso surpresa do primeiro Resident Evil. Isso significou que, quando a outra versão de Resident Evil 2 finalmente chegou, fãs tinham passado meses olhando para um jogo totalmente diferente e muitos estavam, previsivelmente, confusos.
O jogo morto-vivo
O passar do tempo deu a 1.5 um status quase lendário. Diferente de outros jogos cancelados, ele tinha sido amplamente visto e jogado, mesmo
anos após o eventual lançamento de Resident Evil 2 – durante uma visita à Capcom para conferir o Resident Evil 3, repórteres da Game Informer mencionaram o jogo perdido e, pra surpresa deles, foram apresentados a uma versão final jogável para experimentar. Até mesmo o fã mais casual de Resident deve ter ouvido falar desse outro Resident, estrelando um policial experiente chamado Leon S. Kennedy e a estudante universitária e motociclista chamada Elza Walker, lutando contra gorilas zumbis e híbridos de aranhas e humanos. Um jogo que de fato nunca aconteceu.
Tudo isso teria passado para a mitologia se uma cópia do jogo não tivesse aparecido quase 15 anos depois. Aquelas imagens desbotadas de revistas e vídeos VHS tremidos que alimentaram uma fervorosa fan-base em fórums por anos foram substituídas por uma verdadeira versão jogável do RE2 que nunca existiu. Isso deixou as pessoas verem o jogo por elas mesmas, jogá-lo, e até mesmo tentar reconstruí-lo. Mas antes de chegarmos lá, temos que voltar e descobrir porque a Capcom descartou uma continuação quase completa de um dos seus maiores jogos, a quase três meses antes do lançamento. E então começou de novo.
Originalmente, Resident Evil 2 estava com a data de lançamento agendada para Maio de 1997. Esse era um jogo que ainda estrelava Leon S. Kennedy, mas não da mesma forma que você se lembra. Ele ainda era um policial, mas não era seu primeiro dia. Ele era um oficial experiente, preso na delegacia da RPD após a infestação em Racccoon City. Ao mesmo tempo, Elza Walker seria uma personagem completamente nova, uma estudante universitária e piloto de motociclismo retornando para Raccoon City justo quando a infestação zumbi começava. Depois de Elza bater sua moto no prédio da RPD, os dois personagens embarcariam em histórias separadas, ligadas apenas pelas locações e por um punhado de personagens compartilhados, para escapar do levante dos mortos-vivos.
Haviam algumas ideias interessantes sendo testadas originalmente pelo time de desenvolvimento: personagens tinham contagens poligonais menores, o que possibilitava mais zumbis aparecendo na tela. Os monstros “mudariam” com o tempo, com “mutação” sendo mencionada como uma nova habilidade pelo então produtor Shinji Mikami. De forma similar, os cenários pre-renderizados que definiram a série original poderiam ser alterados de acordo com eventos da história. As roupas de Leon e Elza também poderiam mudar para mostrar danos quando eles fossem atacados. Ou então eles poderiam equipar diversas roupas e proteções pra proteção ou armazenamento extra.
Haveriam mais algumas mudanças de tom também. Leon e Elza nunca se encontrariam, mas encontrariam o resultado das ações um do outro (Leon encontraria um caminhão da polícia em chamas e apagaria o fogo, por exemplo, e Elza encontraria o caminhão já queimado, mais tarde. Por outro lado, Elza derrotaria William Birkin mutacionado, que Leon encontraria depois, e assim por diante). As duas histórias separadas iriam se cruzar nos mesmo locais, cada um com seus respectivos personagens de apoio, bem como alguns companheiros compartilhados, mas diferentemente do Resident Evil 2 final, eles nunca se encontrariam pessoalmente.
Ao invés disso, Leon teria a companhia de Marvin Branagh - o policial moribundo de Resident 2 desempenharia um papel mais ativo aqui - e de Linda Wong, uma cientista da Umbrella que acabou sendo renomeada como Ada para fazer referência à nota “Carta de um Pesquisador” encontrada em Resident Evil 1, que começava com “Querida Ada...”.
Elza, por outro lado, encontraria John, um civil que se escondia na RPD (e que mais tarde se tornaria o dono da loja de armas Robert Kendo de Resident Evil 2); Roy, um policial que mais tarde se tornaria um zumbi, e Sherry Birkin. Sherry, juntamente com seu pai perseguidor e mutacionado William e o chefe de polícia Irons seriam encontrados tanto por Leon quanto por Elza. No jogo 1.5, Irons seria um cara bom que ajudaria no jogo, mas que depois foi retrabalhado, se tornando o antagonista corrupto e assassino do 2.
Laços de Sangue
Tanto Sherry quanto William Birkin conectam firmemente o cancelado 1.5 e o 2 – assim como no eventualmente lançado RE2, William perseguiria sua filha pelo jogo. No 1.5 William demonstra uma mutação significativamente mais básica, contudo, ele ainda cresce em resposta ao dano. Sherry é uma das muitas maneiras de identificar material mais inicial – pela maior parte do tempo de desenvolvimento do 1.5, ela vestia uma roupa amarela, mais tarde trocada pela azul e branca do 2. O fato de que o papel e o propósito de ambos esses personagens sobreviveram, e outros personagens foram transportados, ainda que de formas alteradas, demonstra o quanto o time trabalhou e retrabalhou a fundação do 1.5, tentando salvar o que podiam, mas acabando por substituir a maior parte.
A história original tinha os dois heróis lutando pela delegacia de polícia, batalhando contra zumbis e gorilas transformados em armas biológicas pela infecção com o T-vírus que escaparam de vans da Umbrella. Dali, a ação partia para os esgotos, com aranhas gigantes no caminho, eventualmente uma fábrica e as instalações do laboratório da Umbrella. O pouco que sabemos da trama envolve os personagens deixando a delegacia e passando pelos esgotos para encontrar um grupo policial que foi enviado para investigar a fábrica. Ao chegar no local, encontramos o grupo dizimado e, após sofrer um ataque do William Birkin já transformado, tudo se transfere para os laboratórios Umbrella. Isto é, ao menos na história do Leon, motivada pela necessidade de criar uma vacina para Marvin, que é infectado.
No entanto, conforme o 1.5 se aproximava de sua data prevista de lançamento em Maio de 1997, ninguém na Capcom parecia feliz com ele. As partes individuais funcionavam, mas não se encaixavam. Em uma entrevista dada para um guia de dicas de 1998, Shinji Mikami declarou que “nenhum elemento era especificamente entediante, apenas o jogo como um todo”, complementando em outra entrevista que “não era divertido”. A delegacia de polícia era um alvo em particular: baseada numa edificação moderna e normal encontrada no filme de 1976
Assalto à 13º DP, ela parecia limpa e chata se comparada à mansão do primeiro jogo. “Nós olhamos o segundo andar, o terceiro e o subsolo e tudo tinha a mesma aparência”, explicou Mikami. Ela foi redesenhada utilizando fotos de “prédios de estilo ocidental” em Kyoto, Osaka e Nagoya, segundo Kamiya, que o time entrou sorrateiramente para fotografar, antes de serem pegos e expulsos.
“Eu acreditava que eles tinham um bom material, era só jogar na panela e cozinhar, e ainda que tivesse um gosto ruim, nós podíamos consertar. Então, quando eu provei, eu fiquei chocado pelo gosto ruim, gosto RUIM [...] algo drástico estava fazendo esse gosto ruim. Eu tive de dizer a eles para começar tudo de novo” Shinji Mikami, em uma entrevista em 1998.
Até mesmo a ideia de usar mais inimigos não estava funcionando: “nós focamos em fazer zumbis utilizando o mínimo de polígonos possíveis, a fim de mostrar o maior número deles ao mesmo tempo na tela. Mas aqueles zumbis não eram nada assustadores, ainda que houvessem muitos deles”, explicou Mikami. O time também não gostava do fato de que, tirando os zumbis e a Umbrella, não havia ligação com o jogo anterior.
Sem ter certeza sobre o que fazer, ou como consertar isso, a Capcom trouxe para o projeto Noboro Sugimura, que à época era um escritor de scripts profissional, para ajudar com consultoria. O conselho dele? Começar de novo. Isso levou ao primeiro adiamento, anunciado em fevereiro de 1997, empurrando a data de lançamento de Maio para Agosto de 1997, enquanto os desenvolvedores começavam a desmontar o que eles tinham. As mudanças começaram a criar um Resident Evil 2 mais reconhecível imediatamente – ao invés de Leon começar na delegacia de polícia de lutar para sair de lá, Sugimura sugeriu que ele deveria começar nas ruas e lutar para entrar, criando uma sensação dupla de perigo externo e segurança interna. A RPD foi retrabalhada como um ridiculamente re-propositado museu de arte gótico, e Elza virou Claire Redfield, irmã mais nova de Chris e âncora firme para a história original.
Enquanto isso acontecia, a Capcom continuava a utilizar várias builds do 1.5 para promover o jogo. Conforme as novas ideias ganhavam forma, ela mandou várias versões de material antigo para demonstrações e shows de negócios, ou os utilizou para vídeos e imagens. O último avistamento público do 1.5 é considerado como o ocorrido na Tokyo Game Show de abril de 1997. No entanto, uma revista japonesa chamada Hyper Playstation Remix ainda colocava material novo do jogo, nunca antes visto, no seu disco de capa em Dezembro de 1997.
Pelo caminho, no entanto, a Capcom também fez várias coisas que apenas confundiram os fãs e contribuíram para a lenda do 1.5. Na E3 de 1997, um vídeo promocional do jogo usou material de duas builds diferentes do 1.5
e do 2, o que levou alguns a acreditar que uma terceira versão, híbrida, chegou a existir por um tempo. E em Agosto de 1998 a versão japonesa de Resident Evil Director’s Cut apresentava clipes de um “Resident Evil 2” que parecia ser, em maior parte, do jogo final lançado – contendo uma delegacia de polícia museu de arte e Claire Redfield – também mostrava Leon lutando contra um Hibrido Aranha excluído, e uma locação da fábrica em chamas.
É interessante notar que o Director’s Cut foi lançado para preencher o vazio criado pelo adiamento da sequência, com Mikami dizendo em uma entrevista de 1997: “Eu pensei em relançar o Resident Evil original, incluindo minhas desculpas aos fãs pelo lançamento tardio de Resident Evil 2”.
O que quer que esse jogo iria ser, uma vez que Resident Evil 2 saiu em Fevereiro de 1998, Resident 1.5 deveria ter aos poucos sumido da memória. Mas não sumiu. Ao invés disso, ele deu início a uma caçada que durou bem mais que 15 anos, pelo o que era visto por muitos como o “verdadeiro” Resident Evil 2, e por outros como uma curiosidade colecionável que eles tinham que encontrar.
O que de fato existe do 1.5 fora da Capcom é discutível, mas há, dependendo das fontes, algum número entre 5-7 versões que existiram em algum ponto. No entanto, quanto maior o número, menos crível é a prova. Além disso, algumas dessas contas incluem variações do mesmo código, ou mudanças que só foram vistas em materiais promocionais. As duas principais builds do 1.5 que os colecionadores rapidamente voaram em cima são as ditas 40%, ou a build de Novembro (em referência a quando ela foi feita em 1996) e a 80%, ou build “final” (apesar de tanto Mikami quanto Kamiya terem afirmado que o jogo estava 65-70% completo, no máximo).
Para aumentar a bagunça, existem ainda as demos Biohazard Beta 1 e Beta 2 do novo Resident Evil 2, lançadas em dois estágios diferentes do seu desenvolvimento – e que são diferentes o suficiente para causar confusão aos olhos de um leigo. Essas versões ainda continham cenários e outros materiais do 1.5 escondidos em seu código, e mais tarde se tornaram armadilhas quando as pessoas começaram a tentar reconstruir o jogo perdido.
Nos anos que se seguiram, muitos dos primeiros avistamentos eram na verdade falsos – com tanta informação antiga disponível, era fácil para as pessoas fingirem que elas estavam jogando, mas quando eram pressionadas por mais informações pelos colecionadores, se calavam. No fim dos anos 90, com internet de baixa velocidade e mensagens trocadas em pequenos fórums, qualquer versão do 1.5 que
de fato existia, existia em disco, nas mãos de colecionadores reservados, que não compartilhavam. A percepção era de que apenas uma pequena elite sortuda tinha o jogo e se recusava a deixar outros experimentá-lo. Existia o rumor de que “cópias amigas” ocasionalmente eram distribuídas e que, ocasionalmente, algo novo vazava, apenas para tudo se fechar no instante que alguém notasse.
Isso significou que até meados dos anos 2000, a cena de fãs do Resident 1.5 era uma bagunça tóxica de sniping*, ataques e contra-argumentações se alguém viesse a dar a entender que tinha uma cópia do jogo. Havia muitos caminhos sem-saída, ameaças e pegadinhas, além de ofertas para comprar builds do jogo por milhares de dólares (e até mesmo ideias estranhas como inundar a Capcom de cartas para os forçar a lançar o jogo). Imagens e vídeos apareciam de vez em quando, e logo eram desacreditadas ou então a pessoa que as postou era caçada até sair da internet. Com o seu valor ligado diretamente a sua indisponibilidade (“o protótipo é um ‘Símbolo de Status’”, como um usuário de fórum postou), ninguém estava disposto a simplesmente dar o jogo. Em 2001, uma “versão jogável de Resident Evil 1.5” foi listada no eBay por US$1.025, e o leilão acabou de forma dúbia, sendo incerto se alguma venda foi feita de fato.
[*nota do tradutor: não entendi muito bem o que ele quis dizer com o 'sniping' ali não]
Na verdade, é melhor pular a maior parte desse período da história de Resident Evil 1.5, já que ela está cheia de narradores pouco confiáveis e trollagens. Ao invés, vamos pular para o fim de 2011, quando uma cópia legítima do jogo finalmente emergiu. De onde ela veio não é lá muito claro, com histórias de um leilão do espólio de um empregado da Capcom falecido, ou de um colecionador com uma imagem ISO arquivada em um disco rígido. Qualquer que seja a fonte, o equilíbrio estava mudando: com a existência do código do 1.5, o valor financeiro do disco começou a parecer meio duvidoso – “é apenas questão de tempo antes dele ser lançado na natureza”, uma postagem diria em 2012.
O rumor é que a versão de 40% da build do Resident 1.5 foi comprada por US$9.000,00 no fim de 2011, por um grupo que juntou suas finanças, de um vendedor que estava ciente de que o código poderia se tornar sem valor a qualquer hora. Um grupo chamado Time IGAS (abreviatura para “I’ve got a shotgun”, uma piada interna da comunidade de RE) formou-se ao redor dessa build. Ao invés de disponibilizá-la, eles planejavam reconstruir e recriar o jogo perdido, algo que imediatamente partiu a volátil base de fãs. Algumas pessoas acreditavam que apenas a build 40% pura que contava, enquanto outros chamaram a tentativa de restauração, com suas adições e mudanças, não importando o quão bem pesquisadas, de versão “Frankenstein”. Existiram até algumas teorias bizarras sobre o Time IGAS estar, de alguma forma, escondendo o conteúdo original do jogo.
De qualquer forma isso não importava, já que apenas meses após o início do projeto de restauração, uma build aparentemente vazou quando uma recente adição ao Time IGAS teria tentado vendê-la online. Em 2013, uma build foi disponibilizada gratuitamente pelo time, podendo ser jogada em emuladores básicos (sem links aqui, só as declarações). Isso nos deu a build conhecida como Magic Zombie Door (ou MZD), uma colcha de retalhos do código original e de materiais retrabalhados que tenta criar uma interpretação jogável do intento da Capcom. Ela incluía mudanças como tradução do texto japonês e o uso de materiais modificados e repropositados para substituir e recriar personagens e salas faltantes. A “Pure Vanilla Build” (ou PVB) surgiu pouco depois, aparentemente em resposta. Ela perece ser a versão original, não adulterada, do código. Está em japonês, vários modelos estão incompletos, várias salas estão desconectadas, ou conectadas de formas sem sentido, tornando-a injogável pela maior parte sem o uso do menu de debug para se mover entre as áreas.
Parece loucura que o interesse de fãs no que é essencialmente um rascunho grosseiro e não lançado de um jogo foi caçado e investigado por 15 anos. E é mais loucura ainda que isso valeu a pena: agora ele está por ai, numa forma que qualquer um pode jogar se souber onde procurar. E essa exposição não acabou com o interesse. Um tópico sobre o jogo iniciado em Abril de 2012 foi atualizado por último em Julho de 2018, onde o progresso da recriação do jogo é descrito como “caminhando”. Até mesmo a build MZD do jogo, originalmente lançada em 2013, foi atualizada em Julho de 2018 com um novo patch. Para um jogo incompleto de 22 anos de idade, que nunca foi lançado de fato, isso não é nada mal, e explica porque, todo esse tempo depois, uma personagem que nunca esteve na série ganha uma skin de DLC no Resident 2 Remake.
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