Ivo Maropo
Bam-bam-bam
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É, eu sei, esta é uma pergunta (que nos parece) boba, excessivamente nostálgica e click-bait, mas eu argumento que ela não é. Reforçando o argumento que eu já defendi aqui anteriormente, a maravilha dos anos 90 consiste em ter nos dado tudo (mas apenas como promessa). A lista é vasta: internet, CD/multimídia, gráficos poligonais, portáteis, sensores de movimentos, reconhecimento de voz, realidade virtual, jogatina online, sem mencionar a explosão dos arcades, o começo do PC gaming, etc e etc.
Até mesmo o gênero de mundo aberto, o nosso mais amplamente aceito paradigma atual, já existia de forma embrionária - Ocarina of Time, por exemplo, já nos exibia um vasto mundo aberto tridimensional onde podíamos passar horas apenas vasculhando o seu mundo à esmo, sem sequer tocar na sua Main Quest. Tudo isto já era "palpável" (mas sem ainda ser "concreto"). Tudo isto "já existia" nos anos 90 (ou, melhor dizendo, começava a existir excitantemente).
Mas uma coisa também é importante: foi praticamente tudo de uma vez. Ao passo que hoje a extensão destas promessas já nos foi mais ou menos revelada, naquela época, eram a pura imaginação de um futuro ainda fascinante, e cheio de perguntas ainda sem respostas. Talvez boa parte aqui não se recorde (ou sequer tenha vivenciado), mas, de fato, "tudo já se encontrava lá". As revoluções foram todas apresentadas ali, nos sobrando apenas as evoluções de hoje.
Aquele continuado fluxo de novidades mágicas, excitantes e arrebatadoras só existiu mesmo ali. Hoje, temos basicamente o mantra do "mais internet e gráficos", precisamente uma evolução previsível e pouco excitante de revoluções anteriores, praticamente todas começadas nos anos 90. O próprio Wii Remote, ou então a Xbox Live, foram fenômenos cujo embrião já se apresentava décadas antes, em coisas como a Power Glove, e a Sega Net.
Seguindo a lição de que a verdadeira felicidade não está em se ter tudo aquilo que sempre se quis, mas num abençoado meio-termo entre o ter e o desejar (neste caso, o sonhar), fica fácil de entender o tamanho do problema. Hoje, estamos muito mais entediados do que antes. "Somos todos Nutellinhas". A sensação de hoje é de que o próprio consumo em si diretamente se nos apresenta como entediante e insuficiente, como se um raio-x lhe houvesse atingido o cerne e por fim pudéssemos presenciá-lo em toda a sua flagrante estupidez (antes camuflada pelo boom da explosão do consumo pós-muro de Berlim - ou seja, os anos 90).
É claro que uma longa série de "prós" também foi inaugurada com os avanços tecnológicos. Com o desenvolvimento da internet, ganhamos em comodidade e numa disponibilidade democratizante (na figura da sofisticação dos atuais consoles, e das facilidades de download/upload da internet - sejam estes ilegais ou não). Sim, a cultura foi, ao menos até um certo ponto, consideravelmente "universalizada", mas o que nós ganhamos com X, nós também perdemos com Y. Ao mesmo passo que nos tornamos mais autônomos/autossuficientes, precisamente ao se ter "pleno acesso" à tudo o que sempre desejávamos, também nos isolamos, com menos solidariedade física e presença em carne e osso.
Noutras palavras, o caminho para a nossa criticada "geração Nutella" começava a ser pavimentado. Como eu sempre gosto de dizer aqui, um obstáculo não somente bloqueia a nossa obtenção daquilo que desejamos, como também mantém o seu horizonte. Retire aquilo que nos bloqueia o acesso pleno e irrestrito a X, e boa parte do que nos fez querer acessá-lo em primeiro lugar também se esvai consigo, vê-se subitamente dissolvido. Tudo o que considerávamos serem apenas obstáculos desafortunados para a nossa obtenção das coisas, também garantiam em si a sua vivacidade.
Fliperamas, revistas de videogame, locadoras e tudo mais da época garantiam que tudo retivesse em si uma certa aura mágica e excepcional, pois ainda não tínhamos consoles potentes o suficiente para dispensar de vez os fliperamas, a jogatina online para "superar" a presença física da jogatina split-screen de sofá, e nem a pirataria (bem como as facilidades em geral) da internet para nos auxiliar a superar a necessidade de locações, ou a compra de revistas com a disponibilidade de conteúdo online.
Sim, repetindo novamente aqui, ganhamos em individualidade, mas também perdemos como sociedade (só nos restando uma "só-ciedade" cada vez mais reclusa em si, cínica, "esclarecida", "realista" e narcisista, e dos "outros" cada vez mais distanciada). A pergunta que faço é: será que valeu mesmo a pena? Será que não perdemos mais à médio-longo prazo do que ganhamos enquanto sociedade?
Até mesmo o gênero de mundo aberto, o nosso mais amplamente aceito paradigma atual, já existia de forma embrionária - Ocarina of Time, por exemplo, já nos exibia um vasto mundo aberto tridimensional onde podíamos passar horas apenas vasculhando o seu mundo à esmo, sem sequer tocar na sua Main Quest. Tudo isto já era "palpável" (mas sem ainda ser "concreto"). Tudo isto "já existia" nos anos 90 (ou, melhor dizendo, começava a existir excitantemente).
Mas uma coisa também é importante: foi praticamente tudo de uma vez. Ao passo que hoje a extensão destas promessas já nos foi mais ou menos revelada, naquela época, eram a pura imaginação de um futuro ainda fascinante, e cheio de perguntas ainda sem respostas. Talvez boa parte aqui não se recorde (ou sequer tenha vivenciado), mas, de fato, "tudo já se encontrava lá". As revoluções foram todas apresentadas ali, nos sobrando apenas as evoluções de hoje.
Aquele continuado fluxo de novidades mágicas, excitantes e arrebatadoras só existiu mesmo ali. Hoje, temos basicamente o mantra do "mais internet e gráficos", precisamente uma evolução previsível e pouco excitante de revoluções anteriores, praticamente todas começadas nos anos 90. O próprio Wii Remote, ou então a Xbox Live, foram fenômenos cujo embrião já se apresentava décadas antes, em coisas como a Power Glove, e a Sega Net.
Seguindo a lição de que a verdadeira felicidade não está em se ter tudo aquilo que sempre se quis, mas num abençoado meio-termo entre o ter e o desejar (neste caso, o sonhar), fica fácil de entender o tamanho do problema. Hoje, estamos muito mais entediados do que antes. "Somos todos Nutellinhas". A sensação de hoje é de que o próprio consumo em si diretamente se nos apresenta como entediante e insuficiente, como se um raio-x lhe houvesse atingido o cerne e por fim pudéssemos presenciá-lo em toda a sua flagrante estupidez (antes camuflada pelo boom da explosão do consumo pós-muro de Berlim - ou seja, os anos 90).
É claro que uma longa série de "prós" também foi inaugurada com os avanços tecnológicos. Com o desenvolvimento da internet, ganhamos em comodidade e numa disponibilidade democratizante (na figura da sofisticação dos atuais consoles, e das facilidades de download/upload da internet - sejam estes ilegais ou não). Sim, a cultura foi, ao menos até um certo ponto, consideravelmente "universalizada", mas o que nós ganhamos com X, nós também perdemos com Y. Ao mesmo passo que nos tornamos mais autônomos/autossuficientes, precisamente ao se ter "pleno acesso" à tudo o que sempre desejávamos, também nos isolamos, com menos solidariedade física e presença em carne e osso.
Noutras palavras, o caminho para a nossa criticada "geração Nutella" começava a ser pavimentado. Como eu sempre gosto de dizer aqui, um obstáculo não somente bloqueia a nossa obtenção daquilo que desejamos, como também mantém o seu horizonte. Retire aquilo que nos bloqueia o acesso pleno e irrestrito a X, e boa parte do que nos fez querer acessá-lo em primeiro lugar também se esvai consigo, vê-se subitamente dissolvido. Tudo o que considerávamos serem apenas obstáculos desafortunados para a nossa obtenção das coisas, também garantiam em si a sua vivacidade.
Fliperamas, revistas de videogame, locadoras e tudo mais da época garantiam que tudo retivesse em si uma certa aura mágica e excepcional, pois ainda não tínhamos consoles potentes o suficiente para dispensar de vez os fliperamas, a jogatina online para "superar" a presença física da jogatina split-screen de sofá, e nem a pirataria (bem como as facilidades em geral) da internet para nos auxiliar a superar a necessidade de locações, ou a compra de revistas com a disponibilidade de conteúdo online.
Sim, repetindo novamente aqui, ganhamos em individualidade, mas também perdemos como sociedade (só nos restando uma "só-ciedade" cada vez mais reclusa em si, cínica, "esclarecida", "realista" e narcisista, e dos "outros" cada vez mais distanciada). A pergunta que faço é: será que valeu mesmo a pena? Será que não perdemos mais à médio-longo prazo do que ganhamos enquanto sociedade?