na entrega que é algo secundário do jogo.
A entrega é o core do game.
É o elemento principal, através do qual todos os outros inúmeros componentes - que serão literalmente inúmeros, em se tratando desse game designer, nunca vem nada abaixo de três dezenas de elementos de jogabilidade e mecânicas diferentes - se ramificarão.
Eu costumo classificar esse tipo de game, que tem como característica os múltiplos sistemas e mecânicas, como “jogão”, onde a linha de design alimenta a expansão, a complexidade e a sofisticação. O “joguinho” é o game que presa pela simplicidade e fun factor fácil, a recompensa imediata, o design enxuto e palatável. Você pode trocar “jogão” e “joguinho” por “hardcore” e “casual”, ou “game pra encher a cabeça” e “game pra esvaziar a cabeça”.
Lembrando que um não é necessariamente melhor que o outro, e não há correlação entre qualidade e essa classificação, embora eu pessoalmente valorize subjetivamente muito mais um jogão que um joguinho, em função da óbvia necessidade de maior dedicação e talento para se acertar no primeiro tipo. Escrever um tratado vai ser sempre bem mais difícil que uma novela, outrossim os tratados mal escritos marquem bem mais negativamente uma empreitada. A queda do cavalo é maior que a queda dum pônei.
Eu digo isso porque, até antes da revelação completa, eu estava sem saber se o próximo projeto de Hideo seria um game pra “esvaziar a cabeça”, em função das turbulências com o projeto imensamente ambicioso e denso que foi a obra de arte MGS V, “preocupação” alimentada pelas declarações de que viria um jogo menor, e não um game pra “encher a cabeça”, subtipo em que Kojima é o mestre incontestável e ombudsman.
Mas quem espera que Death Stranding gravite em torno de outra coisa que não o Delivery Service de Sam vai se decepcionar. O “I deliver things” é o cerne de tudo, é a força motriz através da qual os múltiplos sistemas vão atuar. Espere inclusive por piadas com Fetch Quests. Serão muitas.
A única coisa que desviará desse core é o Hades, que se passa nas grandes guerras da humanidade. Esse é “outro game”, um jogo dentro do jogo, sobre o qual sabemos pouco. Pelo que vi, ele pode variar desde um cenário mais linear e fechado, baseado em stealth + exploração por loot, com combate single, até uma espécie de Arena Battle Royale enrustida. Eu tenho alguns palpites para o Hades, vamos ver que surpresas ele guardará.
De qualquer forma, o que foi mostrado à respeito das mecânicas de Delivery já é altamente convincente de algo fresco, fora do padrão e diferente. A quantidade de sistemas que está em voga para executar essas tarefas mostradas nessa pequena amostra de gameplay já é mais expansiva que outros games inteiros de grande sucesso. Perceba que dá pra ter certeza de muita coisa assistindo com atenção a essas apresentações, conforme mostra meus 4 últimos posts nesse tópico nas páginas anteriores. É só os ler.
A divulgação do game é críptica e reptícia, e deveria ser assim até o final em minha opinião. O tom é o da dúvida, da interrogação e da nuance, mas Kojima abriu as pernas pra massa (isso nunca pode acontecer em quem tem a capacidade criativa acima da média), ele devia ter seguido o excelente movimento de dubiedade, o bizarro e o curioso, que desde o princípio permearam a propaganda do game. O jogo não vai servir à massa casual de qualquer maneira, a sua exibição na medina é um imã de chicote e pedrada. Concordo com você que a mãe Sônya provavelmente pediu pra expor a figura desse game na praça também, por pressão popular. Um possível erro de Kojima foi trazer o Reedus, as pessoas associam sua figura a algo mais pop, coisa que esse game nunca foi, nem nunca será.
Sobre as primeiras cenas da jogatina, ele revelou que será algo “explosivo”, então provavelmente o prólogo é a explosão literal da bomba que cria o fenômeno, possivelmente com uma sessão de gameplay no Hades, que é seguramente para onde Sam Porter Bridges vai quando “morre”.
Escalar, caminhar e usar gadgets para traversal será muito do game, mais ainda que em BOTW. Os encontros de combate fora do Hades serão poucos, pode apostar, não tem margem pro Hideo trolar aqui.
Lógico, traversal é gameplay também, eu cometeria suicídio se gameplay de videogame fosse só bater ou atirar, a vida seria um saco, que deprê. Como o traversal é obviamente gameplay, só precisa ser bom, e eu acho que vai ser, aí ele pode até consistir a experiência integral da jogatina que, ainda sim, pelo que foi mostrado, uma masterpiece histórica pintará no pedaço.